"Disse Jesus: 'Nem ele nem seus pais pecaram, mas isto aconteceu
para que a obra de Deus se manifestasse na vida dele. Enquanto é dia,
precisamos realizar a obra daquele que me enviou. A noite se aproxima,
quando ninguém pode trabalhar. Enquanto estou no mundo,
sou a luz do mundo'" (João 19.3,4).
Observem,
caros amigos, nosso Senhor Jesus Cristo não se deixava desconcertar
diante da mais violenta oposição dos seus inimigos. Os judeus tinham
apanhado pedras para apedrejá-lo, e ele se escondeu deles; mas tão logo
tivesse passado por um único átrio e ficado fora do alcance da vista
deles, parou e fixou seus olhos num mendigo cego, que estava sentado
perto da porta do templo. Receio que a maioria entre nós não tivesse
ânimo para ajudar nem sequer os mais necessitados enquanto nós mesmos
escapávamos das pedradas lançadas contra nós; e se tivéssemos tentado
fazer essa obra, movidos por suprema compaixão, a teríamos levado a
efeito de modo desajeitado, com muita pressão, e certamente não teríamos
conversado de modo calmo e sábio, conforme fez o Salvador ao responder à
pergunta dos seus discípulos, e passou a raciocinar com eles.
Uma
das coisas dignas de nota no caráter de nosso Senhor é sua maravilhosa
quietude de espírito, mormente sua notável calma na presença daqueles
que o julgavam mal, e o ofendiam, e o caluniavam. É frequentemente
vituperado, mas nunca perturbado; está frequentemente perto da morte,
mas sempre cheio de vida. Por certo, ele sentia agudamente todas as
contestações dos pecadores contra si, pois numa passagem nos Salmos que
se refere ao Messias lemos: "A zombaria partiu-me o coração" (Sl 69.20).
Entretanto, o Senhor Jesus não permitiu que seus sentimentos o
dominassem, sempre estava calmo e com presença de espírito, e agia com
profunda isenção das calúnias e ataques dos seus mais ferrenhos
inimigos.
Entendo
que, uma das razões por ele ser tão auto-suficiente, é que nunca ficava
enlevado pelo louvor dos homens. Acreditem nisso: se alguma vez se
permitirem ser agradados por aqueles que falarem bem de vocês, serão
capazes de se magoarem na mesma medida por aqueles que falam mal de
vocês. Mas se aprenderem (e é uma lição demorada para a maioria de nós)
que não são servos dos homens mas, sim, de Deus, e que vocês não
morrerão se eles os censurarem, então vocês serão fortes e demonstrarão
que alcançaram a estatura varonil em Cristo Jesus. Se o grande Mestre se
permitisse virar a cabeça pelos hosanas da multidão, então, seu coração
se desalentaria dentro dele quando exclamavam: "Crucifique-o,
crucifique-o!" Mas ele não se sentia enaltecido nem abatido pelos
homens; não se confiava nas mãos de homem nenhum, pois sabia o que havia
neles.
A
razão mais interior dessa quietude de coração era sua comunhão
ininterrupta com o Pai. Jesus morava à parte, pois convivia com Deus: o
Filho do homem, que desceu do céu, continuava habitando no céu, sereno e
paciente porque estava enaltecido acima das coisas terrestres, nas
santas contemplações da sua mente perfeita. Porque seu coração estava
com o Pai, o Pai o tornou forte para suportar tudo o que lhe viesse da
parte dos homens. Quem dera que todos nós usássemos essa armadura da
luz, a panóplia celestial da comunhão com o Altíssimo Eterno. Nesse
caso, não teríamos mais medo das más notícias, nem das más ocorrências,
pois nosso coração estaria firmado na rocha segura do amor imutável do
Senhor.
Havia,
talvez, outra razão pela maravilhosa compostura do nosso Senhor ao ser
atacado com pedradas: seu coração se fixava tanto na sua obra que não
podia ser desviado dela, por mais que os judeus incrédulos fizessem
contra ele. Essa paixão dominante o levava para adiante dos perigos e
sofrimentos, e o levava a desafiar com calma toda a oposição. Entrara no
mundo a fim de abençoar as pessoas, e não deixaria de abençoá-las. Os
judeus podiam se opor a ele por um motivo ou por outro, mas não podiam
desviar a correnteza da sua alma do leito da misericórdia, ao longo do
qual se precipitava como torrente. Ele precisava fazer o bem aos
sofredores e aos pobres, não podia deixar de fazer isso; seu rosto
volta-se com firmeza em direção à sua obra vitalícia. Para ele, praticar
a vontade de quem o enviara passara a ser como sua comida e bebida; e
assim, quando os judeus apanharam pedras, embora ele se afastasse um
pouco, porém, posto que somente quisesse conservar sua própria vida para
a prática do bem, voltou-se à sua obra vitalícia sem demora. As
pedradas não podem desviá-lo das suas atividades graciosas. Assim como
vemos um pássaro com ovos ou filhotes, afugentado momentaneamente do seu
ninho, voltar no mesmo instante em que o intruso se afasta, assim
também vemos nosso Senhor voltar à sua obra santa quase antes de ele
estar fora da vista dos que queriam assassiná-lo. Ali está sentado um
cego, e Jesus se põe imediatamente ao seu lado para curá-lo. Eles vão te
alcançar, ó Cristo! Eles tentarão matar-te! Seguram mais pedras nas
mãos cruéis. Os que te odeiam arremessam seus mísseis com ferocidade e
chegarão a ti num só momento! Ele não se importa com isso! Nenhum
espírito de covardia pode levá-lo a deixar passar em branco uma
oportunidade para glorificar o Pai. Aquele cego precisa de atendimento
e, correndo todos os riscos, Jesus pára a fim de lidar com ele com amor.
Se vocês e eu ficarmos completamente ocupados no zelo por Deus, com o
desejo de conquistar almas, nada nos atemorizará. Suportaremos toda e
qualquer coisa, e não nos parecerá que estamos aguentando coisa alguma;
escutaremos calúnias como se nem as ouvíssemos, e suportaremos as
adversidades como se não existissem. Assim como a flecha, atirada por um
arqueiro forte, desafia o vento ao seguir em sentido contrário e voa
rapidamente até ao centro do alvo, assim também nós voaremos em direção
ao grande objetivo da nossa ambição compassiva. Bem-aventurado aquele
homem que Deus lançou como raio da sua mão, que precisa continuar até
cumprir seu destino; bem-aventurado aquele cuja vocação é levar os
pecadores aos pés do Salvador. Ó bendito Espírito, enaltece-nos para
habitarmos com Deus, e nos simpatizarmos com sua compaixão paternal, de
modo a não prestarmos atenção às pedradas, nem às zombarias, nem às
calúnias, e nos ocuparmos totalmente no nosso serviço abnegado por amor a
Jesus!
Sirva
de introdução o que foi dito até agora. O Salvador, na sua condição
pior e mais baixa, quando estava perto da morte, só pensa no bem das
pessoas. Enquanto olhos cruéis o espionam para buscarem ensejo para
matá-lo, o olhar de Jesus se fixa no pobre cego; Jesus não tem nenhuma
pedra do seu coração contra os tristes, mesmo quando as pedras passam
zumbindo por suas orelhas.
I. Assim, portanto, apresento para vocês a primeira divisão da presente mensagem, que é O OBREIRO.
Entrego este título, bem merecido, ao Senhor Jesus Cristo. Ele é o
obreiro por excelência, o obreiro principal, o exemplo para todos os
obreiros. Ele entrou no mundo, segundo ele mesmo diz, para cumprir a
vontade de quem o enviou, e para completar esta obra. Nessa ocasião,
quando é perseguido por seus inimigos, não deixa de ser um obreiro - um
operador de milagres com o cego. Existem muitos neste mundo que
desconsideram a tristeza [do próximo], que evitam os que sofrem mágoas,
que estão surdos diante das lamentações, e cegos diante das aflições. O
modo mais fácil que conheço para lidar com essa cidade onde moramos,
maligna e desgraçada, é não ficar sabendo muito a respeito dela. Dizem
que metade do mundo não sabe como a outra metade vive; certamente se
soubesse não viveria de modo tão descuidado, nem seria tão cruel como o
é. Existem vistas nesta metrópole que derreteriam um coração de aço e
tornariam generoso um Nabal. Mas fechar os olhos para não ver nada da
desgraça alheia que rasteja diante dos seus pés é um modo fácil de
escapar do exercício da benevolência. "Onde a ignorância é felicidade, é
tolice ser sábio"; assim disse um ignorante de vida fácil em tempos
antigos. Se os mendigos são importunos, os transeuntes precisam ser
surdos. Se os pecadores são profanos, é muito fácil para nós tampar os
ouvidos e seguir adiante, com pressa.
Se
esse cego precisa ficar sentado e mendigar diante da porta do templo,
os que frequentam o templo devem passar rapidamente como se fossem tão
cegos como ele. As multidões passam por ele e não o levam em conta. Não é
assim que agem as pessoas hoje em dia? Se você está com aflição - se
está com o coração partido -, elas não passam por você, sem
considerá-lo, e seguem seu caminho para seu negócio ou sua casa, embora
você esteja deitado, passando fome? O rico acha conveniente manter em
ignorância as feridas de Lázaro. Não é assim com Jesus. Seu olhar é
rápido para perceber o mendigo cego, mesmo que não veja outra coisa. Se
ele não está embevecido com as pedras maciças e a bela arquitetura do
templo, não deixa de fixar seus olhos num mendigo cego diante da porta
do templo. Ele é todo olhos, todo ouvidos, todo coração, todo mãos, onde
estiver presente a desgraça. Meu Mestre é feito de ternura; ele derrete
de amor. Ó almas sinceras que o amam, imitem a ele nisso, e sempre
deixem seu coração ser tocado por um sentimento fraternal pelos
sofredores e pelos pecadores. Existem outros que, embora percebam a
desgraça, não a diminuem mediante a calorosa simpatia, mas a aumentam
mediante as suas conclusões lógicas frias. "A pobreza", dizem eles,
"ora, pois bem: ela é obviamente provocada pela embriaguez e pela
preguiça e por todos os tipos de vícios." Não digo que não é assim em
muitos casos; mas digo que semelhante observação ajudará um pobre a se
tornar melhor ou mais feliz; semelhantes palavras severas servirão mais
para exasperar os endurecidos do que assistir aos que estão enfrentando a
luta. "As enfermidades", dizem alguns, "oh, sem dúvida um grande
montante de doenças é provocado por hábitos iníquos, a negligência das
leis sanitárias", e assim por diante. Isso, também, pode ser a triste
verdade, mas range no ouvido do sofredor. Não é uma doutrina muito
bondosa e agradável para ensinar nas enfermarias dos nossos hospitais!
Eu recomendaria que vocês não a ensinassem até que vocês mesmos ficarem
doentes, e talvez então a doutrina não lhes pareça ser tão instrutiva.
Até mesmo os discípulos de Cristo, ao ver esse cego, achavam que devia
existir algo de notavelmente iníquo em seu pai e em sua mãe, ou algo de
especialmente maligno no próprio homem, que Deus previu, e por conta do
qual o castigou com a cegueira.
Os
discípulos tinham a mesma atitude dos três consoladores de Jó, os
quais, ao verem o patriarca no monturo, destituído de todos os seus
filhos, e tendo sido roubados todos os seus bens, e ainda se raspando
porque estava coberto de úlceras, disseram: "Obviamente, deve ser
hipócrita. Deve ter feito alguma coisa muito terrível, senão não estaria
tão gravemente afligido." O mundo insiste em ficar com sua crença
infundada de que, se a torre de Siloé cair sobre algumas pessoas, elas
devem ser pecadoras mais do que qualquer outro pecador na face da Terra.
É uma doutrina cruel, uma doutrina vil, apropriada para selvagens, mas
que não deve ser mencionada pelos cristãos, que sabe que o Senhor
disciplina a quem ele ama, e até mesmo os mais amados por Deus têm sido
levados embora de repente. Vejo, porém, grande quantidade dessa noção
cruel circulando, e se algumas pessoas passam reveses, ouço o comentário
sussurrado: "Pois bem, elas é que provocaram isso." É assim que vocês
as animam?
Observações
morais baratas, embebidas de vinagre, formam um alimento muito inferior
para um inválido. Semelhantes censuras são um modo imprestável para
ajudar um deficiente a superar um obstáculo - pelo contrário, trata-se
de levantar ainda outro obstáculo diante dele, de modo que não possa
mesmo superá-lo. Ora, noto isso a respeito do meu Senhor - que está
escrito a seu respeito que "a todos dá liberalmente e não o lança em
rosto" (Tg 1.5 - ARC).
Quando ele alimentou aqueles milhares no deserto, ele teria sido muito
justo se lhes tivesse dito: "Por que vocês todos saíram para o deserto e
não trouxeram consigo seus provimentos? O que vocês estão fazendo neste
lugar distante, sem trazer comida? Vocês são imprudentes e merecem
passar fome." Não, não, ele não disse nenhuma dessas palavras, mas
alimentou a todos eles e os mandou para casa bem alimentados. Você e eu
não fomos enviados ao mundo para trovejarmos mandamentos do alto do
Sinai; chegamos até ao monte Sião. Não vamos viajar num circuito como se
fôssemos juízes e algozes ao mesmo tempo, para lidar com todas as
tristezas e desgraças deste mundo com palavras amargas de censura e de
condenação.
Se
fizermos isso, seremos totalmente diferentes do nosso bendito Mestre
que não fala nenhuma palavra de repreensão àqueles que o buscam, mas que
simplesmente alimenta os famintos e cura a todos que precisam! É fácil
criticar, é fácil repreender, mas nossa tarefa deve ser mais sublime e
nobre: a da bênção e da salvação.
Observo,
ainda, que existem alguns outros que, mesmo não sendo indiferentes à
tristeza alheia e mesmo sem defender uma teoria cruel de condenação, não
deixam de fazer especulações quando isso não tem nenhum proveito.
Quando nos juntamos, muitas são as questões que desejamos discutir, mas
que não têm o mínimo valor prático. Há a questão da origem do mal. Esse é
um assunto excelente para aqueles que gostam de argumentar ou de
retalhar a lógica, semanas a fio, sem produzir lascas de lenha
suficientes para acender um fogo no qual se possa aquecer as mãos frias.
Um assunto como esse foi levantado diante do Salvador - culpa prevista,
ou mancha hereditária - "Quem pecou: este homem ou seus pais?" Até que
ponto é certo que o pecado dos pais caia sobre os filhos, conforme
acontece muitas vezes? Eu poderia propor muitos temas igualmente
profundos e curiosos, mas para o que servem? Entretanto, existem muitas
pessoas que gostam desses temas, que tecem teias de aranha, que sopram
bolhas de sabão, que propõem teorias, as desmantelam, e propõem outras.
Fico
duvidando que o mundo já ficou abençoado no valor de um tostão furado
por todas as teorizações de todos os eruditos que já viveram. Isso tudo
não pode ser classificado como altercação vã? Preferiria criar trinta
gramas de ajuda do que uma tonelada de teoria. Acho lindo ver como o
Mestre desmonta a especulação refinada que os discípulos propõem. Ele
diz de modo breve: "Nem ele nem seus pais pecaram", e então cospe no
chão, e faz barro, e abre os olhos do cego. A obra foi esta; o debate
foi mera preocupação. Certo menino disse: "Pai, as vacas estão no campo
de trigo. Como teriam entrado?" Responde o pai: "Filho, não se preocupe
mais com isso, vamos nos apressar para tirá-las de lá." Há bom senso
nessa atitude prática. Aqui, temos essas pessoas afundadas no vício e
ensopadas de pobreza. Deixe para depois as perguntas - como chegaram a
essa condição? Qual é a origem da iniquidade moral? Como é transmitida
dos pais para os filhos? Responda às perguntas depois do dia do juízo,
quando você terá mais luz; mas agora a parte mais importante é vermos
como você e eu podemos tirar o mal do mundo, e como podemos levantar os
caídos e restaurar aqueles que se desviaram. Não vamos imitar o homem da
fábula que viu um menino se afogando e, imediatamente, lhe passou uma
preleção a respeito da imprudência de ir para a água onde não mais dá
pé. Não, não, vamos tirar o menino para a margem, secá-lo e vesti-lo, e
então falar a ele que não deve mais fazer isso para que coisa pior não
lhe aconteça.
Digo
que o Mestre não era especulador; não ia tecendo teorias; não era um
mero visionário; mas se lançava na obra e curava aqueles que
necessitavam de cura. Ora, nisso ele é o grande exemplo para todos nós
neste ano da graça. Vejamos: o que já fizemos para abençoar o nosso
próximo? Muitos entre nós somos seguidores de Cristo, e como devemos ser
felizes por isso. O que já fizemos que fosse digno da nossa chamada
sublime? "Senhor, ouvi uma preleção numa noite destas, a respeito dos
males da intemperança." É só isso que você fez? Surgiu daquela oratória
brilhante e da sua atenção cuidadosa a ela, alguma atuação na prática?
"Ora, senhor, pensarei nisso, algum dia destes." Entrementes, o que
acontecerá com esses intemperantes? O sangue deles não jazerá diante da
porta de vocês? Outro comenta: "Ouvi, faz poucos dias, uma preleção
muito dinâmica e interessante a respeito da economia política, e achava
que se tratasse de uma ciência de muito peso, e que explicasse boa parte
da pobreza que você menciona."
Talvez
fosse assim; mas a economia política, em si mesma, é dura como bronze;
não tem entranhas, nem coração, nem consciência, nem pode levar em conta
semelhantes coisas. O economista político é um homem de ferro, a quem
uma lágrima enferrujaria, e por isso nunca tolera o âmbito da compaixão.
Sua ciência é uma rocha que afundaria uma frota de navios, sem se
comover com os gritos de homens e mulheres que se afundam. É como o
vento oriental do deserto que cresta tudo sobre o que sopra. Parece a
alma das pessoas que chegam a dominar a arte desse vento ou, melhor, são
dominados por ele. É uma ciência de fatos teimosos, que não seriam
fatos se nós não fôssemos tão embrutecidos. Com a economia política ou
sem ela, volto ao meu argumento principal - O que você tem feito em
favor do próximo? Pensemos mesmo nisso, e se alguém entre nós tem
sonhado, dia após dia, com aquilo que faríamos "se", vejamos, o que
podemos fazer agora e, de modo semelhante ao Salvador, por as mãos na
obra.
Entretanto,
não é esse o essencial que quero alcançar. Trata-se do seguinte. Se
Jesus é tão operante, e não teórico, que alguns entre nós que precisamos
dos seus cuidados podemos ter hoje? Estamos decaídos? Somos pobres?
Levamos a nós mesmos à tristeza e à desgraça? Não confiemos nos homens,
nem em nós mesmo? Os homens nos deixarão morrer de fome e depois farão
um exame póstumo do nosso corpo com a ajuda da medicina legal, para
descobrir por que ousamos morrer para, assim, necessitarmos das despesas
de um túmulo e de um caixão. Certamente levantarão um inquérito depois
de tudo se acabar conosco; mas se chegarmos a Jesus Cristo, ele não fará
o mínimo inquérito, mas nos acolherá e dará descanso à nossa alma.
Aquele é um texto bendito: Deus "a todos dá liberalmente e não o lança
em rosto" (Tg 1.5 ARC). Quando o filho pródigo voltou para casa para do
seu pai, o pai deveria lhe ter dito, segundo o modo considerado correto,
de conformidade com o que as pessoas fariam hoje em dia: "Pois bem,
você voltou para casa, e estou contente em vêlo, mas olhe o seu estado!
Como você chegou a esse estado? Ora, você quase não tem um farrapo limpo
no corpo! Como é que você ficou tão pobre? E você está tão magro e
esfomeado; como aconteceu isso? Onde você esteve? O que você andou
fazendo? Com quais companhias você andou? Onde estava você na semana
passada? O que estava fazendo anteontem às sete horas?"
O
pai não lhe fez uma única pergunta, mas o apertou contra o peito e,
instintivamente, sabia tudo a respeito. O filho voltou assim como ele
era, e o pai o acolheu assim como ele era. O pai parecia dizer, com um
beijo: "Meu filho, vamos esquecer o que passou. Você estava morto, mas
agora voltou a viver; você estava perdido, mas agora foi achado, e não
quero perguntar mais nada." É exatamente assim que Jesus Cristo está
disposto a acolher os pecadores arrependidos. Temos aqui uma meretriz
das ruas? Venha, pobre mulher, assim como você está, ao seu querido
Senhor e Mestre, que a purificará do seu pecado grave. "Todo tipo de
pecado e blasfêmia será perdoado." Há alguém aqui que transgrediu as
regras da sociedade, que é apontado como pessoa que transgrediu as
regras da sociedade? Mesmo assim, venha, e seja bem-vindo, ao Senhor
Jesus, a respeito de quem está escrito: 'Este homem recebe pecadores e
come juntamente com eles.'" O médico nunca acha desprezível circular
entre os doentes; e Cristo nunca considerou vergonhoso cuidar dos
culpados e dos perdidos. Pelo contrário: escrevam isso em volta do seu
diadema - "O Salvador dos pecadores, até mesmo do principal deles"; ele
conta isso como sua glória. Ele operará a seu favor e não o repreenderá.
Ele não tratará você com uma dose de teorias e com uma hoste de
repreensões amargas; pelo contrário, ele acolherá você, assim como você
está, nas feridas do seu lado, e ali o esconderá da ira de Deus. Oh, que
bendito evangelho tenho para pregar a vocês! Que o Espírito Santo os
leve a aceitá-lo! Até aqui, falei a respeito do obreiro.
II. Agora, a segunda questão é O ÂMBITO DO TRABALHO.
Todo trabalhador precisa de um local de trabalho. Todo artista deve ter
um estúdio. Cristo tinha estúdio? Sim, veio para realizar obras muito
maravilhosas - as obras daquele que o enviou: mas que lugar tão estranho
o Senhor achou para nele fazer as suas obras! No entanto, não me consta
que pudesse ter achado qualquer outro. Resolveu realizar as obras de
Deus e, para isso, selecionou o lugar mais apropriado. Uma das obras de
Deus é a criação. Se for para Jesus realizar essa obra entre os homens,
ele precisará descobrir onde está faltando alguma coisa que possa suprir
mediante um ato de criação. Aqui estão dois olhos aos quais falta o
aparelho apropriado para receber a luz; aqui, portanto, há oportunidade
para Jesus criar os olhos e a vista. Ele não poderia ter criado olhos na
minha cabeça, nem na sua cabeça, se estivéssemos presentes, pois os
olhos já estão presentes, e mais olhos seriam inapropriados para nós.
No
mendigo cego do templo havia espaço para Jesus produzir o que faltava
no mecanismo curioso do olho; o olho cego, portanto, era a sua oficina.
Se houve globos oculares, estavam totalmente destituídos de visão, e
isso desde o nascimento do homem; essa foi a ocasião para o Senhor Jesus
dizer: "Haja luz!" Se os olhos daquele homem tivessem sido como os seus
e os meus, não teria havido oportunidade para a operação divina de
nosso Senhor; mas, posto que o homem ainda estava nas trevas que o
tinham cercado desde seu nascimento, seus olhos ofereciam espaço no qual
o poder do Onipotente pudesse se manifestar por uma obra tão
maravilhosa que, desde o princípio do mundo, nunca houvera notícia de
cura de um homem que nascera cego. O homem estava cego "para que a obra
de Deus se manifestasse na vida dele." Oh, mas esse é um pensamento
bendito se você quiser pensar a respeito! Aplique-o a você mesmo. Se
faltar alguma coisa em você, há espaço para Cristo operar em você. Se
você for perfeito pela natureza, e não houver nada que falte em você,
então não haverá espaço para o Salvador fazer coisa alguma por você;
pois ele não vai dourar o ouro refinado, nem colocar esmalte branco no
lírio. Mas se você estiver sofrendo com alguma deficiência grave, alguma
falta pavorosa que faz sua alma ficar nas trevas, a sua necessidade é a
oportunidade de Cristo, a necessidade que você tem de graça supre a
necessidade que Cristo tem de objetos para a sua misericórdia. Aí há
espaço para o Salvador vir demonstrar a sua compaixão para com você, e
você pode ter certeza de que ele estará do seu lado imediatamente. Assim
seja: Vem, Senhor Jesus. Ainda por cima, não era somente a deficiência
da vista desse homem, mas também a sua ignorância que precisava da ajuda
do Onipotente. É obra de Deus, não somente criar, mas também iluminar. O
mesmo poder que chama à existência, também chama à luz, seja esta
natural ou espiritual. É uma obra divina iluminar e regenerar o coração
humano. Esse homem estava nas trevas tanto em mente quanto em corpo -
que coisa grandiosa foi iluminá-lo nos dois sentidos! Ele não conhecia o
Filho de Deus e, por isso, não acreditava nele, mas perguntou com
assombro: "Quem é ele, Senhor, para que eu nele creia?" Jesus Cristo
veio para operar nesse homem o conhecimento de Deus, a vida de Deus -
numa palavra: a salvação -; e porque esse homem estava destituído dessas
coisas, havia nele espaço para a perícia e o poder do Salvador. Amigo, é
esta a sua situação? Você não está convertido?
Nesse
caso, existe espaço em você para o Redentor operar mediante a graça que
converte. Você não está regenerado? Nesse caso, existe espaço em você
para o Espírito de Deus operar a regeneração. Todas essas deficiências
espirituais que você tem - sua ignorância e suas trevas - serão
transformadas pelo infinito amor em oportunidades para a graça. Se não
estivesse perdido, você não poderia ser salvo. Se não estivesse culpado,
não poderia ser perdoado. Se não fosse pecador, não poderia ser
purificado. Mas todo o seu pecado, e sua tristeza, mediante um mistério
estranho de amor, é um tipo de qualificação de você mesmo para Cristo
vir salvá-lo. Alguém comenta: "Para mim, o caso assim é apresentado numa
nova luz." Aceite essa nova luz e seja confortado, pois é luz do
evangelho, e tem o propósito de animar os desesperançosos. Você fala:
"Nada de bom existe em mim"; fica claro, portanto, que há lugar para
Cristo ser tudo para você. Você percebe que não podem existir dois
"tudo"; só pode existir um, e já que você não está pretendendo esse
título, Jesus o ostentará. Todo o espaço que você ocupar na sua própria
estima remove o mesmo tanto de espaço da glória do Senhor Jesus; se você
não é nada, sobra essa casa inteira para o Salvador ocupar. Ele
entrará, e encherá todo o seu vácuo interior com sua própria querida
pessoa, e será glorioso aos seus olhos para sempre.
Aventuro-me
a dizer nesta noite que todas as aflições podem ser consideradas desta
mesma maneira: oferecem oportunidades para a obra de misericórdia de
Deus. Sempre que você vê um homem envolto em tristezas e aflições, a
maneira certa de considerar essa situação não é culpar a ele e querer
saber como chegou a esse ponto, mas dizer: "Aqui temos uma abertura para
o amor onipotente de Deus. Trata-se de uma ocasião para a demonstração
da graça e bondade do Senhor." Esse homem, sendo cego, deu ao Senhor
Jesus a oportunidade de praticar a boa ação de lhe restaurar a vista, e
aquela obra era uma maravilha tão grande que todos que estavam ao redor
se sentiram obrigados a notá-la e admirá-la. Os vizinhos começaram a
perguntar a respeito, os fariseus precisaram realizar um conclave a
respeito do assunto; e, embora quase dezenove séculos tenham se
passando, aqui estamos nós, nesta hora, meditando a respeito. Os olhos
abertos desse homem continuam iluminando os nossos olhos nesta hora. A
Bíblia não teria sido completa sem essa narrativa tocante e instrutiva;
se esse homem não tivesse nascido cego, e se Cristo não lhe tivesse
aberto os olhos, todas as gerações teriam recebido menos luz. Devemos
ficar contentes por esse homem ter ficado tão aflito, pois assim
recebemos instrução graciosa. Se ele não tivesse sido destituído da
visão, não teríamos visto a grande visão da cegueira de nascença sendo
expulsa por aquele que é a Luz dos homens.
Assim,
posso falar a todos os aflitos: não sejam rebeldes com suas aflições;
não se deixem perturbar excessivamente por elas, nem se deixem desanimar
totalmente por elas; mas considerem-nas como aberturas para a
misericórdia, portas para a graça, entradas para o amor. O vale de Açor
será para vocês uma porta de esperança. O obreiro poderoso, a respeito
de quem falei, achará uma oficina na aflição de vocês, e nela formará
monumentos da sua graça. Glorifiquem-se nas suas enfermidades para que o
poder de Cristo repouse sobre vocês. Regozijem-se porque, à medida que
as suas tribulações abundarem, assim abundarão as suas consolações por
meio de Jesus Cristo. Peçam a ele que faça todas as coisas cooperar para
o bem de vocês e a glória dele e assim será feito.
Será
completo o meu pensamento a respeito da oficina depois que eu falar que
acredito que o próprio pecado tem um aspecto semelhante ao da aflição,
porque dá lugar à misericórdia de Deus. Dificilmente posso dizer aquilo
que Agostinho disse - ao falar do pecado e da queda de Adão, e
considerando todo o esplendor da graça que se seguiu depois, ele disse:
"Beata culpa" - culpa bendita - como se pensasse que o pecado fornecera
tamanhas oportunidades para o desvendar da graça de Deus, e demonstrara
de tal maneira o caráter de Cristo, que até mesmo ousou chamá-la de
culpa bendita. Não me aventurarei a usar semelhante expressão, e não
ouso fazer mais do que repetir aquilo que aquele grande mestre em Israel
disse em tempos passados; mas digo mesmo que não posso imaginar uma
ocasião para glorificar a Deus comparável ao fato de o homem ter pecado,
posto que Deus entregou Cristo para morrer em prol dos pecadores. Como
aquele dom inefável poderia ter sido outorgado se não tivesse havido
pecadores? A cruz é uma constelação da glória divina mais brilhante do
que a própria criação.
"É, pois, na graça que os homens salvou,
Que sua forma mais nobre da glória brilhou;
Está escrita mais bonita aqui na cruz da salvação
Em sangue precioso e em linhas de carmesim que traz redenção."
Como
poderíamos ter conhecido o coração de Deus? Como poderíamos ter
entendido a misericórdia de Deus? Não fosse o nosso pecado e desgraça,
como poderiam ter sido demonstrados semelhante clemência e amor? Venham,
pois, ó culpados, animem-se, busquem a graça. Assim como o médico
precisa dos enfermos a fim de que possa exercer sua capacidade para
curar, assim também o Senhor da misericórdia precisa de vocês para ele
demonstrar a graça que pode conceder. Se eu fosse um médico, e desejasse
uma clínica, não procuraria saber a respeito da região mais saudável,
mas uma localização onde os enfermos encheriam o meu consultório. Se
tudo quanto eu buscasse fosse praticar o bem ao meu próximo, eu
desejaria estar no Egito ou em algum outro país acometido pelo cólera ou
pela peste, onde pudesse salvar vidas humanas.
O
Senhor Jesus Cristo, olhando para a multidão nesta noite, procura, não
aqueles que são bons (ou que assim se consideram), mas os culpados, que
reconhecem ser essa a sua situação e a lastimam. Se houver aqui um
pecador, leproso e contaminado; se houver aqui uma alma, doente da
cabeça aos pés, sofrendo a enfermidade incurável do pecado, o Senhor
Cristo, o obreiro poderoso, olha para ela, porque nela descobre um
laboratório dentro do qual possa realizar as obras daquele que o enviou.
III. Tenham paciência comigo agora, enquanto passo, em terceiro lugar, a notar de forma breve O SINO DO TRABALHO.
Vocês escutam, bem cedo, um sino que acorda os trabalhadores em suas
camas. Vejam como se deslocam juntos pelas ruas, como abelhas
apressando-se na ida e na volta para a colméia. Você os vê saindo para o
trabalho, pois o sino está soando. Havia um sino do trabalho para
Cristo, também, e ele o ouvia. Então ele disse: "Preciso trabalhar;
preciso trabalhar, preciso trabalhar." O que o levou a fazer isso? Ora, a
visão daquele cego. Tão logo o viu, disse: "Preciso trabalhar." O homem
não pedira nada, nem emitira um som; mas aqueles globos oculares sem
som falavam com eloquência ao coração do Senhor Jesus, e entoavam bem
alto a chamada que Jesus escutou e à qual obedeceu, pois ele mesmo
disse: "Preciso trabalhar."
E
por que precisava trabalhar? Porque viera do céu distante com o
propósito de assim fazer. Viera da parte do trono do seu Pai a fim de
ser um homem com o propósito de abençoar os homens, e não permitiria que
sua longa descida fosse infrutífera. Precisava trabalhar; por qual
outra razão estava aqui, onde havia trabalho para ser realizado?
Além
disso, havia impulsos em seu coração, que não precisamos parar para
explicar agora, e que o forçavam a trabalhar. Sua mente, sua alma, seu
coração, estavam cheios de uma força que produzia atividade perpétua. Às
vezes, quando viajavam, ele selecionava certa rota porque "precisava
passar pela Samaria". Às vezes, procurava as pessoas porque dizia:
"Tenho outras ovelhas que não são deste aprisco. É necessário que eu as
conduza também" (Jo 10.16). Havia em Cristo um tipo de instinto para
salvar os homens, e aquele instinto ansiava por ser gratificado, e não
aceitaria uma recusa. "Preci-so trabalhar", disse ele. Só ver aqueles
olhos cegos o levou a dizer: "Preciso trabalhar", e pensou naquele pobre
homem - como este vivera durante vinte anos e mais nas trevas - como
não conseguira desfrutar das belezas da natureza, ou ver o rosto dos
seus amados, nem ganhar o seu pão de todos os dias; e sentia compaixão
das tristezas daquele homem que ficava nas trevas vitalícias. Além
disso, ao se lembrar de como a alma daquele homem também ficara
encerrada como um prisioneiro na masmorra, em razão da ignorância
grosseira, disse: "Preciso trabalhar, preciso trabalhar. Podem me
apedrejar se quiserem, mas preciso trabalhar. Ouço a convocação e
preciso trabalhar."
Agora,
aprendam esta lição vocês que são seguidores de Cristo. Sempre que
virem o sofrimento, espero que cada um de vocês sinta: "Preciso
trabalhar, preciso ajudar." Se são dignos do Cristo a quem chamam de
líder, que todas as necessidades das pessoas possam impelir vocês,
compelir vocês, constranger vocês a ser uma bênção para elas. Que o
mundo que jaz no iníquo os desperte; que os clamores dos homens da
Macedônia os despertem ao falarem: "Venham para cá e nos ajudem!" Os
homens estão morrendo, e morrendo nas trevas. O cemitério está ficando
cheio, e o inferno também está se enchendo. Os homens estão morrendo sem
esperança; e estão passando para a noite eterna. "Preciso trabalhar."
Eles exclamam: "Mestre, poupa a ti mesmo: a labuta incessante te
esgotará e te levará à sepultura." Mas vejam! Vejam! Vejam! A perdição
engole multidões, descem vivos para o abismo! Escutem seus gritos
lastimosos! Almas perdidas estão sendo excluídas de Deus. "Preciso
trabalhar." Quem dera que eu pudesse colocar a minha mão - ou, muito
melhor, que meu Mestre colocasse a sua mão furada em cada cristão
genuíno e pressionasse-o com ela até ele exclamar: "Não posso ficar
sentado aqui. Preciso ir à obra tão logo o culto termine. Devo, além de
escutar, e contribuir, e orar, também trabalhar."
Pois
bem, essa é uma lição grandiosa; mas não pretendo que seja a lição
principal, pois estou à procura daqueles que anseiam por achar
misericórdia e salvação. Para você, caro amigo, é uma grande bênção se
você quer ser salvo, porque Cristo precisa salvar! Existe nele o grande
impulso de fazer questão de salvar. Sei que vocês dizem: "Não consigo
orar. Nem tenho vontade de orar." Não se preocupem com isso: a questão
está entregue a mãos mais capacitadas. Vejam bem: esse homem não disse
uma palavra; bastava vê-lo para comover o coração do Senhor Jesus. Tão
logo Jesus o viu disse: "Preciso trabalhar." Vocês já viram um homem sem
dotes oratórios, mas que consegue receber esmolas em grande escala? Eu
já. Ele se veste como trabalhador camponês. Usa um blusão comprido e se
senta num cantinho por onde muitos passam; o lugar onde faz seu ponto
fica um pouco fora do trânsito impetuoso, mas suficientemente perto para
conseguir a atenção de muitos transeuntes. Deixa visível uma enxada,
muito surrada pelo uso feito dela por outra pessoa, e nela está escrito:
"Estou morrendo de fome!" Parece extenuado e faminto; a montagem é
extremamente bem feita, e fica tão pálido quanto o giz pode torná-lo.
Oh, quantas moedinhas de cobre entram no seu velho chapéu! Como as
pessoas têm pena dele! Ele não canta uma modinha tristonha; não fala uma
única palavra; no entanto, muitos são comovidos pelo fato de parecer
verdade que está morrendo de fome. Agora, meu caro, você não precisa ser
falso naquilo que faz se apresentar sua desgraça e pecado diante do
Senhor. Nesta noite, quando chegar em casa, ajoelhe-se à beira da sua
cama e diga: "Senhor Jesus, não sei orar; mas aqui estou. Estou
perecendo e me coloco diante da tua vista. Em vez de escutar as minhas
petições, olhe para os meus pecados. Em vez de exigir argumentos, olhe
para a minha iniquidade. Em vez de escutar minha oratória, que nem
possuo, Senhor, lembre-se de que dentro em breve estarei no inferno se o
Senhor não me salvar." Então, o sino tocará, e o grande obreiro achará
que chegou a hora de ele labutar; e dirá, nas palavras do texto em
estudo "Preciso trabalhar", e em você as obras de Deus se manifestarão.
Você será a oficina de Cristo.
IV. Temos mais uma divisão, e esta é o DIA DO TRABALHO. Nosso
Mestre divino disse: "Enquanto é dia, precisamos realizar a obra
daquele que me enviou. A noite se aproxima, quando ninguém pode
trabalhar."
Essas
palavras não se referem a Cristo, o Salvador ressurreto, mas ao Senhor
Jesus Cristo enquanto era homem aqui na Terra. Havia aquele determinado
dia em que ele podia abençoar os homens, e uma vez passado, ele teria
partido; não haveria mais Jesus Cristo na Terra para abrir os olhos dos
cegos ou curar os enfermos; ele não estaria mais presente entre os
homens, para que estes o abordassem como aquele que cura as doenças do
corpo. Nosso Senhor, como homem aqui na Terra, teve um dia. Era somente
um dia - um período breve, não muito prolongado; não poderia ser
prolongado, pois assim era determinado pelo grande Senhor. O dia do seu
sacrifício fora determinado; ele mesmo disse certa vez: "A minha hora
ainda não chegou." Mas essa hora acabou chegando. Nosso Senhor ocupou
trinta anos no seu preparo para a sua obra vitalícia, e então, durante
três anos, cumpriu o trabalho que lhe foi imposto (Is 40.2). Quantas
coisas ele compactou nesses três anos! Serviços prestados durante
séculos a fio não poderiam se igualar às labutas daquele breve período.
Irmãos, alguns entre nós já realizaram trinta anos de trabalhos, mas
fizemos bem pouco serviço, lastimo; e como fica se apenas nos sobrarem
mais três? Sintamos os impulsos da eternidade que se aproxima!
Dentro
de pouco tempo, já não estarei olhando os rostos da multidão, e as
pessoas se lembrarão de mim apenas como um nome; por isso, pregarei da
melhor maneira que eu puder, enquanto tiver força e a minha vida for
prolongada. Dentro de pouco tempo, irmãos, vocês não terão a capacidade
de ir de porta em porta conquistando almas: a rua sentirá a sua falta
com seus folhetos; o distrito sentirá falta de suas visitas regulares.
Faça bem o seu trabalho, porque seu sol não demorará a se por. Essas
palavras talvez sejam mais proféticas para algumas pessoas do que
estamos sonhando. Devo estar falando com alguns que estejam se
aproximando da sua última hora e que dentro em breve prestarão contas. À
obra, irmãos! À obra, irmãs! Digam: "Devemos trabalhar, pois a noite se
aproxima, quando ninguém pode trabalhar." A vida não pode ser
prolongada por assim querermos; a predestinação não encompridará o fio
quando vier a hora de ele ser cortado. A mais longa das vidas será
curta, e, oh, quão curta para aqueles que morrem jovens!
Se
você ou eu omitirmos alguma parte da obra da nossa vida, nunca
poderemos compensar a omissão. Falo com reverência solene a respeito do
nosso Mestre divino, mas, se ele não tivesse curado aquele cego no curto
período em que viveu na Terra, ficaria faltando parte das tarefas que o
Pai o enviou para realizar. Não quero dizer que, como Deus, não
pudesse, a partir do céu, ter dado a vista ao pobre mendigo, mas esse
fato torna o caso mais grave ao se aplicar a nós, posto que não temos a
expectativa de semelhante futuro; se não servirmos aos homens agora,
estará fora do nosso alcance abençoá-los a partir do céu. Essa narrativa
nunca poderia ter aparecido na vida do Filho do homem se ele tivesse se
esquecido de ser gracioso com o cego. O tempo certo para nosso Senhor
trabalhar era enquanto habitava aqui embaixo; se fosse para ele voltar
do céu a fim de curar o homem, isso teria que ser feito num segundo
advento, e não no primeiro; e se até mesmo ele omitisse alguma coisa da
sua primeira missão embaixo, não poderia ser reposta. Depois de você e
eu escrevermos uma carta, escrevemos um pós-escrito; depois de
escrevermos um livro, poderemos escrever um apêndice ou inserir alguma
coisa que omitimos. Mas a esta nossa vida, não poderá haver um
pós-escrito. Devemos fazer nosso trabalho agora ou nunca; e se não
cumprirmos nosso serviço para Deus agora, agora mesmo, enquanto tivermos
a oportunidade à disposição, nunca poderemos cumpri-lo. Se você omitir
alguma coisa ontem, você não poderá alterar o fato do serviço imperfeito
naquele dia. Se estiver mais zeloso agora, será a obra de hoje; mas o
ontem continuará sendo tão incompleto quanto você o deixou. Devemos,
portanto, ficar alerta para cumprir a obra daquele que nos enviou,
enquanto ainda estivermos no hoje.
Chego
a essa conclusão, e aqui começo a terminar - se nosso Senhor Jesus
Cristo era tão diligente para abençoar os homens enquanto estava aqui,
tenho certeza de que não é menos diligente para escutá-los e curá-los
agora, no sentido espiritual que ele continua operando entre os homens.
Quem
dera que eu soubesse levá-los a buscar o meu Senhor e Mestre; pois se
vocês o buscassem, ele será achado por vocês tão certamente como vocês o
buscam. Cristo não perdeu sua entranhável compaixão; não tem coração
frio nem mão relapsa. Vá para ele imediatamente. Falei, há pouco tempo, a
alguns dos piores pecadores, e lhes digo de novo - Vão para Jesus!
Quero falar com alguns entre vocês que não são os piores pecadores, com
vocês que têm sido ouvintes do evangelho e só falharam porque não crêem
em Jesus. Vão até ele imediatamente. Vocês estão relutantes, mas ele,
não. Ele precisa continuar trabalhando, e continuar enquanto durar o dia
do evangelho, pois aquele dia chegará ao fim dentro de pouco tempo. Ele
está esperando e vigiando por você. Oh, venham a ele - venham agora
mesmo. "Não sei o que é vir a ele", diz alguém. Pois bem: vir a Cristo é
simplesmente confiar nele. Vocês são culpados; confiem nele para
perdoá-los. "Se eu fizer assim", pergunta alguém, "posso continuar
vivendo como antes?" Não, isso você não pode, pois quando um navio deve
ser conduzido para dentro do porto e recebe um piloto a bordo, este dirá
ao capitão: "Capitão, se você confiar em mim, vou colocar o navio
dentro do porto em segurança. Olhe, mande descer aquela vela." E eles
não o fazem. "Venha", diz o piloto, "cuide do leme, e governe o navio
conforme mando." Mas eles se recusam. "Pois bem", diz o piloto, "você
disse que confiava em mim." "Sim", responde o capitão, "e você disse que
se confiássemos em você, você nos colocaria no porto; mas não chegamos
ao porto de jeito algum." "Não", diz o piloto, "vocês não confiam em
mim, pois se confiassem, fariam o que lhes mando." A confiança genuína
obedece aos mandamentos do Senhor, e estes proíbem o pecado. Se você
confia em Jesus, você deve deixar de pecar, tomar a sua cruz, e seguir a
ele. Semelhante confiança receberá com certeza a sua recompensa: você
será salvo agora, e salvo para sempre.
Que Deus abençoe vocês, caros amigos, por amor a Cristo.
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