Grande é o meu privilégio em poder dirigir-me a este nobre grupo de pregadores do evangelho. Quisera ter maior capacidade para a tarefa. Não tenho a prata da oratória eloqüente, nem o ouro do pensamento profundo. Mas o que tenho lhes dou.
Quanto à conquista de almas, que é ganhar uma alma? Espero que acreditem no método de ganhar almas à moda antiga. Hoje em dia parece que tudo foi sacudido, que tudo foi deslocado dos fundamentos antigos. A impressão que se tem é que nos compete fazer evolver dos homens todo bem já existente neles. Grande coisa conseguirão se experimentarem esse processo! Temo que
no processo de evolução vocês desenvolveriam diabos. Não sei que outra
coisa se pode tirar da natureza humana, O homem está cheio de pecado
como o ovo está cheio de substância, e a evolução do pecado só poderá resultar em mal perene, Todos nós cremos que devemos dedicar-nos à obra de ganhar almas, desejando em nome de Deus ver todas as coisas feitas novas. A velha criatura está
morta e corrompida, e deve ser sepultada. Quanto antes, melhor! Jesus
veio para que todas as coisas antigas passassem, e todas as coisas
fossem feitas novas.
Fazemos o nosso trabalho empenhando-nos em que os homens sejam abençoados
no sentido de torná-los moderados. Queira Deus dar Sua bênção a toda
obra dessa espécie! Entretanto, deveríamos considerar-nos fracassados se
tivéssemos produzido um mundo de abstinentes absolutos, e os
deixássemos todos incrédulos. Almejamos algo mais que a temperança,
pois cremos que os homens precisam nascer de novo. Ê bom que mesmo um
cadáver esteja limpo e, portanto, que a moral dos não-regenerados seja
boa. Seria uma grande bênção se fossem purificados dos vícios que tornam
esta cidade malcheirosa para o olfato de Deus e dos homens justos. Mas
essa não é bem a nossa tarefa. O que nos cabe é que os mortos no pecado
vivam, que a vida espiritual os vivifique, e que Cristo passe a reinar
onde agora o príncipe da potestade do ar exerce domínio.
irmãos,
preguem com o objetivo de que os homens abandonem os seus pecados e
acorram a Cristo em busca de perdão, para serem renovados por Seu
Espírito Santo e venham a amar tudo que é santo, como agora amam tudo
que é pecaminoso. Visem a uma cura radical. O machado está posto à raiz
das árvores. Não se contentem com o remendo feito à velha natureza.
Procurem, antes, que lhes seja concedida, pelo poder de Deus, uma nova
natureza, a fim de que aqueles que se agruparem ao redor de vocês nas
ruas vivam para Ele.
Nosso objetivo é
virar o mundo ao avesso, ou, em outras palavras, fazer repetir-se esta
experiência: "onde o pecado abundou, superabundou a graça". É bom
estabelecer desde o início que aspiramos a um milagre. Alguns irmãos
acham que devem amoldar a sua mensagem ao nível da capacidade dos
ouvintes. É um engano. Segundo esses irmãos, vocês não devem exortar um
homem a arrepender-se e crer a menos que acreditem que ele por si
mesmo pode arrepender-se e crer. Minha resposta é uma confissão: em
nome de Jesus ordeno aos homens que se arrependam e creiam no evangelho, embora saiba que eles não
podem fazer nada disso, se não receberem a graça de Deus. Pois não fui
enviado para agir de acordo com o que minha razão particular possa
sugerir; mas sim de acordo com as ordens dadas por meu Senhor e Mestre.
Nosso método é miraculoso, e nos vem como dom do Espírito de Deus, que
manda os Seus ministros a realizar maravilhas no nome santo de Jesus.
Somos enviados para dizer aos olhos cegos: "Vejam", aos ouvidos surdos: "Ouçam",
aos corações mortos: "Vivam", e mesmo a Lázaro que se decompõe no
túmulo, onde já cheira mal: "Lázaro, sai para fora". Ousamos fazê-lo?
Seremos sensatos se começarmos com a convicção de que somos
completamente incapazes disto, a não ser que nosso Mestre nos tenha
enviado, e esteja conosco. Mas se Aquele que nos enviou estiver conosco,
todas as coisas são possíveis ao que crê. Ó pregador, se está para
levantar-se para ver o que você pode fazer, seja inteligente e
sente-se depressa. Mas se se levantar para provar o que seu onipotente
Senhor e Mestre pode fazer por seu intermédio, infinitas
possibilidades o cercarão! Não há limites para o que Deus pode
realizar, agindo por meio do seu coração e da sua voz.
Certo domingo de manhã,
antes que eu subisse ao púlpito, quando os meus amados irmãos, os
diáconos e os anciãos desta igreja, estavam reunidos comigo para oração,
como costumam, um deles disse a Deus: "Senhor, segura este homem como
um homem segura uma ferramenta e, tendo-a firmemente nas mãos, usa-a
para fazer com ela o que lhe apraz". É disso que todos os obreiros
necessitam — que Deus seja o Obreiro agindo por meio deles. Vocês devem
ser instrumentos nas mãos de Deus. Naturalmente, acionarão
dinamicamente todas as faculdades e forças que o Senhor lhes outorgou;
todavia, jamais confiados em seu poder pessoal, mas dependentes somente
daquela energia divina, sagrada e misteriosa que opera em nós, por nós e
conosco, beneficiando o coração e a mente dos homens.
Irmãos,
ficamos muito desapontados com alguns dos nossos convertidos, não é
mesmo? Sempre haveremos de ficar desapontados com eles enquanto forem nossos. Alegrar-nos-emos grandemente com eles quando se evidenciar que resultam da obra do Senhor, Quando o poder da graça
opera neles, então será como certo irmão diz: "Glória"! — e nada mais,
nada menos que glória. Pois a graça traz consigo glória, mas a simples
oratória somente resultará em engano e vexame. Quando pregamos, e nos
ocorre uma bela e florida passagem, uma frase elegante e poética, espero
que nos iniba aquele temor que agiu em Paulo quando disse que não
usaria a sabedoria de palavras, "para que a cruz de Cristo se não faça
vã". O dever do pregador do evangelho, tanto em recinto fechado como ao
ar livre, é dizer de si para si: Posso falar com muita arte, mas, neste
caso, os ouvintes poderiam fixar-se no meu modo de falar. Portanto, vou
falar de maneira que observem somente o valor intrínseco da verdade
que desejo ensinar-lhes".
Não
é nossa maneira de colocar o evangelho, nem nosso método de
ilustrá-lo, que conquista almas, mas o próprio evangelho realiza a obra
pela operação do Espírito Santo. NEle, portanto, devemos pôr a nossa
confiança para a conversão dos homens. Há de operar-se um milagre pelo
qual os nossos ouvintes se tornarão produtos daquele grandioso poder que
Deus exerceu em Cristo quando O ressuscitou dos mortos, e O pôs à Sua
direita nos lugares celestiais, acima de todo principado e poder. Por
isso, devemos deixar de olhar-nos a nós mesmos, fixando o nosso olhar
no Deus vivo. Não é isto? Razão porque buscamos uma conversão total e
verdadeira, e isso nos leva a recorrer ao poder do Espírito Santo. Se se
trata de um milagre, é claro que Deus é que o há de realizar. Não será
por meio de arrazoados, persuasões ou ameaças. Somente o Senhor o
poderá fazer.
Se no que temos dito se funda a conquista de almas, de que modo podemos esperar confiantes que o Espírito Santo nos revista para que em Seu poder saiamos a pregar? Respondo
que grande parte depende da condição da pessoa do pregador. Estou
persuadido de que nunca demos suficiente ênfase à obra de Deus em nosso
próprio ser em relação com o nosso serviço a Deus. É possível a um
homem consagrado ficar completamente revestido da energia divina, de
modo que todos ao seu redor necessariamente o percebam. Eles não
poderão dizer o que é, nem donde vem, nem, talvez, aonde vai; mas há
algo nesse homem que está muito além da ordem comum das coisas. Noutra
ocasião aquela mesma pessoa pode estar fraca e desalentada, tendo
consciência disso. Olhem! Move-se como das outras vezes, mas não
consegue fazer nada de grandioso. É evidente que até mesmo Sansão
precisa estar em condições apropriadas, ou, se não, não alcançará
nenhuma vitória. Se o cabelo do campeão for cortado os filisteus
zombarão dele; se o Senhor se aparta de um homem, não lhe resta nenhum
poder para prestar serviço útil.
Caros irmãos,
examinem com cuidado a sua condição pessoal perante Deus. Zelem pela
sua própria fazenda. Cuidem bem dos seus rebanhos e manadas. Se não
andarem junto a Deus, se não habitarem na diáfana luz que cerca o trono
de Deus, somente conhecida dos que vivem em comunhão com o Eterno,
deixarão os seus aposentos e sairão apressados para o trabalho, mas sem
resultado algum. Ê certo que o vaso é de barro apenas. Contudo, tem seu
lugar no plano de Deus. Entretanto, não se encherá do tesouro divino, a
menos que seja um vaso limpo, e a menos que, em outros aspectos, seja
digno de ser usado pelo Senhor. Deixem-me mostrar-lhes alguns modos
pelos quais muitos depende do homem a conquista de almas.
Agindo como testemunhas ganhamos algumas almas para Cristo. Levantamo-nos e testificamos de Cristo quanto a certas verdades. Ora, nunca tive o grande privilégio
de ser posto em embaraço por um advogado. Às vezes me pergunto que
faria se fosse colocado como testemunha para ser examinado e
reexaminado. Creio que simplesmente diria a verdade conforme a
conhecesse, sem tentar exibir meu talento, nem meu domínio da língua,
nem meu critério de julgamento. Se me limitasse a dar respostas diretas
e sinceras às perguntas, venceria a todos os advogados do mundo. Mas a
dificuldade está em que, com muita freqüência, quando uma testemunha é
chamada para depor, fica mais preocupada consigo mesmo do que com
aquilo que deve dizer. Daí, logo fica inquieta, irritada e enfadada e,
perdendo o autodomínio, deixa de ser boa testemunha em prol da causa.
Pois bem, vocês
que pregam ao ar livre, se verão freqüentemente em dificuldades. Não
faltarão advogados do diabo para persegui-los, pois ele tem grande
número deles constantemente a seu serviço. A única coisa que vocês devem
fazer, é dar testemunho da verdade. Não é de bom alvitre
perguntar-se.- "Como posso responder inteligentemente a este homem, de
modo que o vença?" Muitas vezes é bom dar uma resposta engenhosa, mas
uma resposta revestida de graça é melhor. Procurem dizer a si próprios:
"Afinai de contas, não importa que esse homem prove que sou um tolo ou
não, pois isso eu já sei. Alegro-me por ser considerado tolo por
amor a Cristo, e não devo ficar preocupado com a minha reputação. Tenho
que dar testemunho do que sei e, com a ajuda de Deus, vou fazê-lo com
coragem. Se o interlocutor me interrogar sobre outras coisas, dir-lhe-ei
que não vim dar testemunho senão disto. Só de um assunto falarei, e de
nada mais".
Assim, irmãos,
é preciso que aquele que dá testemunho seja salvo, e tenha certeza
disso, ignoro se vocês duvidam da sua salvação. Talvez deva
recomendar-lhes que preguem mesmo se for esse o caso, visto que, não
sendo salvos, entretanto querem que outros o sejam. Não duvidam de que
uma vez desfrutaram plena segurança. Agora, se têm que confessar, "ah,
não sinto o pleno poder do evangelho no meu coração", poderão na verdade
acrescentar, "contudo, sei que é real, pois o vi salvar a outros, e
sei que nenhum outro poder é capaz de me salvar". Talvez mesmo
essa débil confissão, tão verdadeiramente sincera, faça brotar uma
lágrima nos olhos do seu opositor e o leve a simpatizar-se com vocês.
Disse John Bunyan; "Às vezes eu pregava sem esperança, como um homem em
cadeias a homens em cadeias, e quando ouvia meus grilhões a ranger,
continuava dizendo aos outros que havia livramento para eles, e os
compelia a olharem para o grande Libertador". Eu não faria Bunyan parar
de pregar assim. Ao mesmo tempo, é uma grande coisa poder declarar por
experiência própria que o Senhor quebrou as portas de bronze e
despedaçou as trancas de ferro. Os que ouvem nosso testemunho dizem:
"Tem certeza disso?" Certeza? Tenho tanta certeza disso como a certeza
que tenho de que estou vivo. Chamam a isso de dogmatismo. Não importa. O homem deve saber o que prega, ou então,
que vá sentar-se. Se eu tivesse alguma dúvida dos assuntos sobre os
quais prego deste púlpito, deveria envergonhar-me de continuar como
pastor desta igreja. Mas prego o que sei, e testifico do que vi. Se
estou enganado, estou enganado profundamente e de coração. Arrisco minha
alma e todos os seus interesses eternos pela veracidade daquilo que
prego. Se o evangelho que proclamo não me salva, jamais serei salvo,
pois aquilo que proclamo a outros constitui a minha base pessoal de
confiança. Não tenho um barco salva-vidas particular. A arca para a qual
convido outros é a que me leva, a mim e a tudo quanto tenho.
Uma
boa testemunha deve saber o que vai dizer. Deve sentir-se em casa,
quanto ao seu assunto. Digamos que seja arrolado como testemunha em
certo caso de roubo. Sabe o que viu, e tem que fazer declaração
disso apenas. Começam a interrogá-la sobre um quadro da casa, ou sobre a
cor de um vestido pendurado no guarda-roupa. A testemunha responde:
"Vocês vão indo além do depoimento que me cabe fazer. Só posso dar
testemunho daquilo que vi". O que sabemos e o que não sabemos dariam
dois enormes livros, e bem podemos pedir que nos deixem de lado quanto
ao segundo volume.
Irmão,
diga o que sabe, e sente-se. Mas fique tranqüilo e mantenha a
compostura enquanto estiver falando daquilo com que está pessoalmente
familiarizado. Nunca dará adequada vazão às suas emoções ao pregar, de
modo que se sinta em casa com os ouvintes, enquanto não se sentir em
casa com o seu tema. Quando souber onde põe os pés, terá a mente livre
para o ardor. A menos que vocês, pregadores ao ar livre, conheçam o
evangelho do princípio ao fim, e saibam onde se firmam ao pregá-lo, não
poderão pregar com a devida emoção. Mas quando sentirem que dominam bem
a doutrina, levantem-se e sejam tão ousados, fervorosos e importunos
quanto queiram. Encarem os ouvintes com a convicção de que irão
falar-lhes algo que vale a pena, algo de que estão bem seguros e que
para vocês eqüivale à própria vida. Em toda reunião ao ar livre, como em
toda reunião em recinto fechado, existem corações sinceros cujo
único desejo é ouvir falar de crenças sinceras. Eles as aceitarão e serão levados a crer no Senhor Jesus Cristo.
Todavia, vocês não são apenas testemunhas; são advogados do Senhor Jesus Cristo. Ora,
num advogado, muita coisa depende do homem. Parece que a marca do
cristianismo em alguns pregadores não é a língua de fogo e, sim, um
bloco de gelo. Vocês não gostariam de ter um advogado que defendesse a
sua causa de modo deliberado e frio, sem jamais mostrar a menor
preocupação quanto a possibilidade de serem declarados culpados de
assassinato, ou julgados inocentes. Como poderiam suportar a sua
indiferença quando vocês estão a ponto de receber a pena de morte? Não!
Vão querer calar um advogado assim tão falso. De igual modo, quando um
homem tem de falar por Cristo, se não tem ardor é melhor que vá dormir.
Vocês dão risada; mas não é melhor que ele vá para a cama dormir, em
vez de pôr a dormir toda uma congregação sem cama para acomodar-se?
Sim, devemos estar dominados por bem fundado fervor. Se havemos de prevalecer sobre os homens, temos que amá-los.
Muitos têm genuíno amor pelos homens; outros têm genuína aversão por
eles. Conheço alguns cavalheiros, por quem tenho alguma estima, que
parecem acreditar que a classe operária é, em geral, terrivelmente má, e
que deve ser contida e governada com rigor. Com idéias desse tipo,
jamais conseguirão a conversão de operários. Para ganhar homens para
Cristo, é preciso pensar, "sou um deles. Se estão tristes, sou um deles;
se são pecadores perdidos, sou um deles; se necessitam de um Salvador,
também eu, como eles'5. Ao maior pecador deveriam pregar com
esta passagem diante dos olhos: "Tais fostes alguns de vós". Somente a
graça nos faz diferentes, e essa graça pregamos. O verdadeiro amor a
Deus e o ardente amor aos homens constituem as grandes qualidades do
defensor da Causa.
Conquanto certas pessoas o neguem, creio também
que se deve exercer a influência do temor sobre a mente dos homens,
cuja influência deve agir igualmente sobre a pessoa do próprio pregador.
"Noé ... temeu, e, para salvação da„sua família, preparou a arca." Nos
temores de Noé houve meio de salvação para este mundo, de modo que não
perecesse no dilúvio. Quando um homem teme tanto pelos outros que o seu
coração chega a exclamar: "Perecerão, perecerão, afundarão no inferno,
serão banidos para sempre da presença do Senhor", e quando esse temor
oprime a sua alma, pesando sobre ele, e o leva a sair e pregar com
lágrimas nos olhos, então sim, pleiteará com os homens de modo a
prevalecer!
"Assim que, sabendo o temor que se deve ao Senhor, persuadimos os homens." O conhecimento desse temor é o meio para aprender a persuadir, e
não para falar duramente. Alguns têm empregado os terrores do Senhor
para aterrorizar; Paulo, porém, se utilizava deles para persuadir.
Imitemo-lo! Digamos: "Ouvintes, irmãos, viemos dizer-lhes que o mundo
está em chamas, que devem fugir para salvar suas vidas, e subir aos
montes, para não serem consumidos". Temos que proclamar esta advertência
com plena convicção de que é verdadeira ou, de outro modo, seremos
como o menino que tolamente gritava: "O lobo vem!" Algo da sombra do
tremendo dia final deve cair sobre o nosso espírito para dar o tom de
convicção à nossa mensagem de misericórdia, ou então nos faltará o
verdadeiro poder do advogado. Irmãos, temos que dizer aos homens que há
premente necessidade de um Salvador, e mostrar-lhes que temos
consciência dessa necessidade e que sentimos por eles. Caso contrário,
não nos será possível fazê-los voltar-se para o Salvador.
Quem advoga em favor de Cristo deve, ele próprio,
comover-se ante a perspectiva do dia do juízo. Quando chego àquela
porta de trás do púlpito e dou com aquela enorme multidão, muitas vezes
fico apavorado. Penso naquelas milhares de almas imortais que me
contemplam através das janelas dos seus olhos anelantes, reflito em que
tenho de pregar a todos os que ali estão, e que serei responsável por
seu sangue se não lhes for fiel. Digo--lhes que isso me deixa a ponto de
recuar. Mas eis que o temor não tica sozinho. Ganho vida nova pela fé e
esperança de que Deus tenciona abençoar aquelas pessoas mediante a
Palavra que Ele me capacitará a transmitir. Creio que cada um daquela
multidão foi mandado ali por Deus com algum propósito, e que eu fui enviado para o cumprimento desse propósito.
Freqüentemente
penso comigo, quando estou pregando: "Quem será que está sendo
convertido agora?" Jamais me passa pela cabeça que a Palavra do Senhor
possa falhar. Não! Isto nunca poderá acontecer. Muitas vezes tenho a
certeza de que pessoas estão sendo convertidas, e sempre estou seguro de
que Deus é glorificado pelo testemunho da Sua Verdade. Vocês podem
estar certos de que a sua esperançosa convicção de que a Palavra de Deus
não tornará a Ele vazia é um grande incentivo para os ouvintes, como o é
para vocês. A sua confiança entusiástica de que eles serão convertidos
pode ser como o dedo mínimo da mamãe estendido para o seu bebê,
ajudando-o a avançar até ela. O fogo existente em seus corações pode
lançar uma fagulha às almas dos ouvintes mediante a qual a chama da vida
espiritual se inflamará neles. Aprendamos todos a arte de pleitear com
os homens em prol de Cristo.
, Ainda, caros pregadores ao ar livre, e todos vocês, cristãos aqui presentes, temos de ser não só testemunhas e advogados, mas também exemplos, Um
dos mais bem sucedidos meios de caçar patos silvestres é o emprego do
pato-chamariz. Este entra na rede, e os outros o seguem. Na igreja
cristã precisamos fazer maior uso da santa arte do chamariz; quer dizer,
o exemplo., indo nós mesmos a Cristo, vivendo nós mesmos piedosamente
em meio a uma geração perversa; nosso exemplo de alegria e tristeza,
nosso exemplo de santa submissão à vontade de Deus na adversidade, e em
toda forma de procedimentos benévolos, será o meio de induzir outros a
entrarem no caminho da vida.
Naturalmente ninguém
vai pôr-se a falar na rua sobre o seu exemplo pessoal; mas não há
pregador ao ar livre que não seja mais conhecido do que ele pensa. No
seio da multidão pode haver alguém que conhece a sua vida particular.
Uma vez ouvi falar de um pregador de praça pública a quem um ouvinte
gritou: "Ah, João, você não teria coragem de pregar dessa
forma em frente da sua casa!" O que acontecera pouco antes,
infelizmente, foi que o senhor João havia desafiado seu vizinho para
uma briga e, portanto»
não é provável que ele pregasse perto de sua casa. Isso fez daquela
interrupção um verdadeiro desastre. Se a vida de alguém no lar for
indigna, essa pessoa deverá viajar muitos quilômetros antes de
levantar-se para pregar e, ao levantar-se, não deverá dizer nada. Os
outros nos conhecem, irmãos, sabem muito mais de nós do que podemos
imaginar — e o que não sabem, inventam. O nosso comportamento e as
nossas palavras devem constituir a parte mais poderosa do nosso
ministério, Isso é o que se chama ser coerente, quando os lábios e a vida estão de acordo.
Abrevia-se o meu tempo, mas devo dizer uma palavra sobre outro ponto mais. Eu disse que a ação do Espírito Santo depende em grande parte do servo de Deus, mas devo acrescentar que também dependerá muito da classe de pessoas que rodeiam o pregador. O
pregador que tenha que ir para o trabalho ao ar livre inteiramente só,
estará em situação deveras infeliz. É extremamente proveitoso estar
ligado a uma igreja zelosa e dinâmica que estará orando por você. E se
não puder achar uma igreja assim para o seu trabalho, o segundo melhor
recurso é conseguir meia dúzia de irmãos e irmãs que o apoiem,
acompanhem e, principalmente, orem por você. Alguns pregadores são tão
independentes que podem realizar seu trabalho sem auxiliares, mas serão
sábios se não procurarem causar impressão com isso. Acaso não poderiam
considerar a questão da seguinte maneira? Ora, se eu for acompanhado
por meia dúzia de homens, estarei beneficiando esses jovens e
preparando-os para que venham a ser obreiros. Se pudermos associar-nos a
um grupo assim que não seja constituído só de jovens, mas um tanto
avançados no conhecimento da verdade divina, esse companheirismo será
de grande vantagem mútua.
Confesso que, embora Deus me esteja abençoando
em Sua obra, não obstante, nenhum crédito é meu, e sim dos amigos no
Tabernáculo e em todo o mundo que fazem-me assunto especial de suas
orações. Um homem só pode sair-se bem com pessoas a sua volta como as
que tenho. Meu caro amigo, o diácono William Olney, disse certa vez:
"Até aqui o nosso ministro nos tem conduzido para diante, e nós o temos
seguido de coração. Tudo tem sido um sucesso. Não
confiam em sua liderança?" O povo bradou; "Sim!" Então meu amigo
continuou: "Se o nosso pastor nos trouxe até uma vala que parece
intransponível, vamos tratar de enchê-la com os nossos corpos para que
ele passe sobre nós", Foi uma fala e tanto! A vala encheu-se, e não
apenas isto, mas pareceu encher-se no mesmo instante. Se você tem um
verdadeiro companheiro, a sua força é mais que duplicada.
Que bênção
é uma boa esposa! Vocês, mulheres que não estariam em seu devido lugar
se começassem a pregar nas ruas, podem fazer com que seus maridos se
sintam felizes e à vontade quando chegam em casa, e isto 05 fará pregar
muito melhor! Algumas podem ajudar os seus esposos doutra forma também,
se são prudentes e amáveis. Você pode, com ternura, fazer seu esposo
entender que saiu um pouco da linha em certas coisas pequeninas, e
talvez ele dê atenção e se corrija. Uma vez um bom irmão me pediu que
lhe desse algumas instruções, alegando o seguinte: "O único professor
que tive foi minha mulher, que teve melhor escolaridade do que eu. Eu
dizia coisas como esta: "Nós era" e "Vi ele". Com meiguice ela me fez
ver que as pessoas poderiam rir-se de mim se eu não cuidasse da
gramática". Desse modo, sua esposa foi sua professora do idioma pátrio, e
lhe valeu seu peso em ouro, como ele o reconheceu. Vocês, que contam
com tais auxiliares, devem dar graças a Deus por eles, diariamente.
Em seguida, é
de grande ajuda unir-se fraternalmente a algum cristão de coração
ardente que saiba mais do que nós, e nos beneficiará com sugestões
sensatas. Talvez Deus nos abençoe por amor de outros, quando não nos
abençoaria por amor de nós. Creio que vocês conhecem a estória monacal
do homem que através de suas pregações conquistara muitas almas para
Cristo, e se congratulava consigo mesmo por isso. Uma noite lhe foi
revelado que no grande dia final não receberia nenhuma honra por aquele
feito. Perguntou ao anjo, em seu sonho, quem teria então direito à
honra, e a resposta foi: "Aquele ancião surdo, que se assenta na escada
do púlpito e ora por você, foi o instrumento da bênção".
Sejamos gratos por aquele velhinho surdo, ou por aquela anciã,
ou por aqueles modestos e piedosos amigos, mediante cuja intercessão
bênçãos se derramam sobre nós. O Espírito de Deus abençoará dois, quando
talvez não abençoe um. Sozinho, Abraão não conseguiu salvar nem uma das
cinco cidades, apesar de que a sua oração eqüivalia a uma tonelada na
balança. Pouco além estava o seu sobrinho, um dos mais pobres quinhões.
Não tinha em si mais que quinze gramas de oração, mas essa magra fração
pesou na balança, e Zoar foi preservada. Acrescentem, pois, os seus
inexpressivos quinze gramas ao peso mais potente dos rogos dos santos de
renome, pois talvez lhes sejam necessários.
Diletos irmãos,
pregadores de praça pública, não estou tentando ensinar-lhes. Alguns
de vocês poderiam ensinar-me muito melhor. Todavia, não estou bem certo,
pois suspeito que eu esteja envelhecendo conforme o que ouvi
recentemente. No início deste ano (1887), uma senhora que estava pedindo
dinheiro a mim, me disse: "Recordo-me de ter ouvido sua apreciada voz
há mais de quarenta anos". "Ouviu minha voz há quarenta anos atrás!",
exclamei; "onde foi isso?" "O senhor estava pregando na parte baixa de
Pentonville Hill, perto da capela do sr. Sawday". "Muito bem", disse eu,
"não foi há mais de quarenta anos?" "Sim", respondeu ela; "talvez
cinqüenta." "Ah! creio que eu era bem jovem nessa ocasião, não era?"
"Claro que sim", disse ela, "o senhor era uma beleza de rapaz." Esta foi
decerto uma declaração desnecessária e não creio que ela tenha
continuado tão certa de que eu era "uma beleza de rapaz" quando preguei
em Pentonville Hill, depois que lhe disse que jamais preguei no local
mencionado por ela, que cinqüenta anos atrás eu tinha só três anos de
idade e que eu achava que devia ter vergonha de pensar que eu lhe daria
dinheiro a troco de suas lorotas. Contudo, esta noite vou tomar como
válida a afirmação daquela mulher e imaginar que sou aquela venerável
pessoa descrito por ela, pelo que ousarei dizer-lhes: Caros irmãos, se queremos ganhar almas para Cristo, é preciso que nos ponhamos resolutamente a trabalhar com energia.
Primeiro, devemos esforçar-nos em nossa pregação. Vocês
não estão desconfiados do valor da pregação, não é? Ainda bem que não.
Espero que não fiquem cansados dela, embora seja certo que a pregação
vos deixará cansados às vezes. Continuem pregando. Sapateiro, limite-se
ao sapato; pregador, limite-se à pregação. Naquele grande dia, quando
for lida a lista de chamada, todos os convertidos por meio de fina
música, de decoração dos templos e de exibições e entretenimentos,
somarão uma décima parte de nada; mas sempre agradará a Deus salvar os
que crêem mediante a loucura da pregação. Apeguem-se à pregação. E se
fizerem alguma coisa mais, não permitam que isso passe para trás a
pregação. Em primeiro lugar, preguem; em segundo lugar, preguem; em
terceiro lugar, preguem!
Confiem na pregação
do amor de Cristo, confiem na pregação do sacrifício expiatório,
confiem na pregação do novo nascimento, confiem na pregação de todo o
conselho de Deus. O velho malho do evangelho continuará fazendo a rocha
em pedaços; o mesmo fogo de Pentecoste continuará queimando no meio das
multidões. Não experimentem nenhuma novidade, mas continuem pregando. E
se todos pregarmos no poder do Espírito Santo enviado do céu, os
resultados da pregação nos deixarão pasmos. Ora, afinal de contas não há
limites para o poder da língua! Olhem o poder de uma língua má; que
grande dano pode fazer! E não dará Deus maior poder a uma boa língua, se
a usarmos direito? Observem o poder do fogo, com uma simples fagulha
pode fazer com que uma cidade fique presa das chamas! Assim também, se o
Espírito de Deus estiver conosco, não precisaremos calcular quanto, nem
o que fazer, pois são incalculáveis as potencialidades da verdade
divina proclamada com o entusiasmo nascido do Espírito de Deus.
lenham firme esperança,
irmãos, tenham firme esperança, a despeito de aí estarem essas
vergonhosas ruas da meia-noite, a despeito desses feéricos palácios do
vício em cada esquina, a despeito da maldade do rico e da ignorância do
pobre. Prossigam; prossigam; prossigam; em nome de Deus, prossigam,
pois se a pregação do evangelho não salvar os homens, nada o fará. Se o
plano da misericórdia de Deus falhar, ponham luto nos céus, e façam
desaparecer o sol numa noite perpétua, porque nesse caso nada restará à
espécie humana senão o negror das trevas. Salvação pelo sacrifício de
Cristo é o ultimato de Deus. Alegrem-se, que ele não pode falhar.
Confiemos sem reserva, e sigamos adiante com a pregação da Palavra.
Os pregadores de praça pública terão o cuidado de adicionar à pregação muitas conversações particulares mantidas
com dedicação e fervor. Quantas pessoas se converteram neste
Tabernáculo por meio da conversação pessoal com certos irmãos aqui
presentes, que não apontarei! Estão todos espalhados por este lugar
enquanto prego. Lembro-me de que, numa noite de segunda-feira, um irmão
me falava algo, e de repente desapareceu sem terminar a frase que estava
dizendo. Não pude saber o que ele ia dizer-me, mas logo o vi na galeria
da ala esquerda, sentado ao lado de uma senhora desconhecida para mim.
Depois do culto lhe perguntei: "Aonde foi você?", e me respondeu: "Um
raio de luz, entrando pela janela, fez-me divisar um semblante tão
triste que subi às carreiras a escada e fui ocupar um assento ao lado de
uma tristonha senhora". "Pôde alegrá-la?" "Decerto que sim! Ela aceitou
prontamente o Senhor Jesus. Nisso observei outro rosto ansioso. Pedi à
senhora que me esperasse ali mesmo até depois do culto, e fui em busca
do outro — agora um jovem." Ele orou com essas duas pessoas, e não se
deu por satisfeito enquanto ambas não entregaram o coração ao Senhor.
Esse é o modo de se manter alerta.
Necessitamos contar com um corpo de artilheiros de precisão
que escolham os seus alvos, um por um. Quando pomos em ação no púlpito a
artilharia pesada, há desempenho, mas muitos não são atingidos.
Precisamos de pessoas cheias de amor, que andem ao redor e tratem de
casos individuais na relação eu-você, com advertências e incentivos
pessoais. Todo aquele que prega ao ar livre, não somente deve pregar a
centenas de pessoas, mas precisa estar preparado para tratar com
pessoas individualmente, e deve contar com outros que tenham o mesmo
talento. Quanto maior benefício poderia ser extraído da pregação feita
nas ruas* se todo pregador dedicado a isso estivesse acompanhado por um grupo de pessoas que levassem avante o trabalho dele por meio da entrevista pessoal!
Domingo passado, meu querido irmão
nos contou um caso que jamais esquecerei. Uma noite se encontrava no
Hospital Croydon, como um dos encarregados de visitação naquela casa de
saúde. O pessoal de serviço já tinha saído e era hora de fechar o
estabelecimento por aquela noite. Ele era a única pessoa no hospital,
além do médico de plantão. De repente um rapaz entrou correndo, e disse
que houvera um acidente ferroviário, e que alguém devia ir logo à
estação levando maça. O médico perguntou a meu irmão: "Quer ajudar-me a
levar a maça, cada um pegando numa ponta?" "Como não!", respondeu ele
prontamente. E lá se foram o médico e o pastor com a maça. Voltaram
trazendo um ferido. "Durante uma ou duas semanas", disse meu irmão fui
muitas vezes ao hospital, porque me interessei muito pelo homem que eu
tinha ajudado a carregar." Acredito que sempre estará interessado
naquele homem, porque uma vez sentiu sobre si o peso dele. Quando você
sabe levar alguém no coração, e sente pessoalmente o fardo dele, o seu
nome fica gravado na sua alma. Assim vocês, que fazem trabalho pessoal,
sentem o peso das almas daqueles com que falam do evangelho. E creio que
é disso que muitos pregadores precisam saber mais, e então pregarão
melhor.
Quando a pregação e a conversação pessoal não são viáveis, tenham à mão um folheto, método
que muitas vezes dá bom resultado. Há folhetos que não serviriam para
converter nem a um besouro. Não há neles nada que interesse nem sequer a
um mosquito. Consigam folhetos que prendam a atenção, ou não usem
nenhum. Um folheto que apresente bem o evangelho, e de modo tocante,
pode ser muitas vezes a semente da vida eterna. Portanto, não saiam sem
levar folhetos.
Acho que, além
de dar folhetos, se lhes for possível, poderiam tratar de conseguir os
endereços residenciais das pessoas que os ouvem com freqüência, para visitá-las. Que
bela coisa, a visita de um pregador de praça pública! "Viva! — exclama a
dona-de-casa ao marido — "veja quem quer ver você! Aquele senhor que
costuma pregar ali na esquina. Mando-o entrar?" "Claro que sim!", vem a resposta. "Ouví-o falar muitas vezes. É um bom sujeito." Façam quantas visitas puderem. Será útil para vocês e para as pessoas visitadas.
Quanto poder há também numa carta pessoal! Há pessoas que ainda têm uma espécie de supersticiosa reverência para com uma carta. E quando recebem uma carta séria de um cavalheiro respeitável, ponderam-na muito, e, quem sabe? — um simples bilhete
enviado pelo correia pode impressionar alguém que ignorou o teu sermão.
Jovens que não estão preparados para pregar fariam grande benefício se
escrevessem cartas aos seus jovens amigos a respeito de suas almas.
Poderiam falar de modo franco e claro com as suas canetas, ao passo que talvez fossem tímidos ao falar com as suas bocas. Salvemos os homens por todos os meios existentes debaixo do céu. Tratemos de impedir que os homens sigam para o inferno. Não temos nem a metade do zelo que devíamos ter. Porventura não se lembram do jovem que estava para morrer? Disse ele ao seu irmão: "Meu irmão, como pode ser tão indiferente para com a minha alma como tem sido?" O outro respondeu: "Não sou indiferente para com a sua alma, pois muitas vezes
lhe falei sobre isso". "Decerto que sim", disse o moribundo; "você
falou mesmo. Mas penso que, de alguma forma, se você tivesse lembrado
que eu estava indo para o inferno, teria tido mais ardor. Teria chorado por mim e, como irmão, não teria permitido que me perdesse." Não deixem que ninguém fale isso de vocês.
Mas ouço a observação de que muitos, ao se tornarem mais fervorosos, fazem tantas coisas esquisitas e dizem tantas coisas estranhas.
Que façam e digam coisas estranhas, se é que provêm de um fervor
genuíno. Não precisamos de enfeites e feitos que sejam apenas um
simulacro do fervor zeloso; mas o ardor candente é a necessidade da nossa época, e onde quer que o vejamos, será uma pena criticá-lo tanto. É preciso deixar que o grande temporal se enfureça a seu modo. É preciso deixar que o coração fremente
de vida fale como pode. Se vocês forem ardorosos, e não puderem falar, o
seu fervor inventará seu próprio método de realizar o seu propósito.
Assim como Aníbal, segundo se diz, derreteu rochas com vinagre, também,
de um modo ou de outro, o fervor dissolverá corações empedernidos. Que o
Espírito de Deus repouse sobre todos vocês, por amor de Jesus Cristo!
Amém.
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