A apresentação do evangelho é assunto sempre importante, pelas consequências eternas que dependem da nossa atitude para com o evangelho. Para mim não há necessidade de argumentar que é especialmente importante nos dias atuais por duas razões: a apostasia geral, o fracasso da parte das igrejas em não apresentarem o evangelho de Jesus do modo como deveria ser apresentado; e a consequente impiedade e o consumado materialismo que crescentemente, caracterizam a vida do povo. Também é um assunto de urgente importância, em face da natureza dos tempos pelos quais estamos passando. A vida é sempre incerta, mas é excepcionalmente incerta hoje. (…)
Que
privilégio maravilhoso o Senhor Deus Todo-poderoso confiar a homens
como nós esta obra de propagar e pregar o evangelho! Ao mesmo tempo é
uma responsabilidade tremenda. (…)
Este
assunto é tão amplo e importante que, obviamente, é impossível tratar
dele adequadamente numa só preleção. Tudo o que posso fazer é selecionar
o que considero como alguns dos mais importantes princípios
relacionados com ele; procurarei ser tão prático quanto poder. (…)
Agora
se me fosse pedido falar sobre este assunto em certos círculos, meu
primeiro trabalho seria tentar definir a natureza do evangelho, e eu
iria adiante e perguntaria: o que é o evangelho? Em muitos círculos as
pessoas se extraviaram; caíram em heresias; pregam um evangelho que,
para nós, não é evangelho nenhum. Pode ser que alguns de vocês
perguntem: “Será necessário gastar tanto tempo no estudo da apresentação
do evangelho? Não seria uma coisa que podemos considerar ponto
pacífico? Se o homem crê no evangelho, ele está incumbido de
apresentá-lo do jeito certo. Se um homem é ortodoxo e crê nas coisas
certas, a sua aplicação do que ele crê é algo que cuidará de si mesmo”.
Isso, para mim é um erro muito grave; e quem quer que seja tentado a
falar assim, não somente ignora a sua própria fraqueza, porém, ainda
mais, ignora o adversário das nossa almas, que está sempre tentando
frustrar a obra de Deus.
(…)
Tomo como prova dois exemplos: Há, por exemplo, homens que parecem
evangélicos em sua crença e doutrina; são perfeitamente ortodoxos em sua
fé e, todavia, a obra que realizam é completamente infrutífera. Jamais
conseguem quaisquer resultados; nunca ficam sabendo de algum convertido
resultante do seu trabalho e do seu ministério. Eles são tão firmes
quanto você, entretanto o ministério deles não leva a nada. Por outro
lado – e esta é a minha Segunda prova – há aqueles que parecem conseguir
resultados fenomenais do seu trabalho e dos seus esforços. Empreendem
uma campanha, ou pregam um sermão e, como resultado, há numerosas
decisões por Cristo, ou o que eles chamam de “conversões”. Contudo,
muitos desses resultados não duram; não são permanentes; são apenas de
natureza temporária ou passageira. Qual a explicação desses dois casos?
(…) Há uma lacuna entre o que o homem crê e o que ele apresenta em seu
ensino ou pregação. O perigo quanto ao primeiro tipo é o de apenas falar
ACERCA do evangelho, exulta nele; porém, em vez de pregar o evangelho,
ele o elogia, diz coisas maravilhosas sobre ele. O tempo todo fica
simplesmente falando sobre o evangelho, em vez de apresentar o
evangelho. O resultado é que, embora o homem seja altamente ortodoxo e
firme, o seu ministério não mostra resultado nenhum.
O
perigo quanto ao segundo homem é o de interessar-se tanto e
preocupar-se tanto pela aplicação do evangelho e pela obtenção de
resultados, que deixa abrir-se uma brecha entre o que ele está
apresentando (aquilo que ele crê) e a concreta obtenção dos resultados
propriamente dito. Como eu disse, não basta você crer na verdade; você
deve ter o cuidado de aplicar da maneira certa o que você crê.
Métodos de Estudo
Há
dois meios principais pelos quais podemos estudar este assunto da
apresentação do evangelho. O primeiro é estudar a Bíblia mesma, com
especial referência a Atos dos apóstolos e às Epístolas do Novo
Testamento. Isso deve ser posto em primeiro lugar, se queremos saber
como se faz este trabalho. Devemos retornar ao nosso livro-texto, a
Bíblia. Devemos retornar ao modelo primitivo, à norma, ao padrão. Em
Atos, e nas Epístolas é-nos dito, uma vez por todas, o que é a Igreja
Cristã e como é, e como se deve realizar a sua obra. Devemos sempre
certificar-nos de que os nosso métodos estão em harmonia com o ensino do
Novo Testamento.
O
segundo método é suplementar; é fazer um estudo da história da Igreja
Cristã subsequente aos tempos do Novo Testamento. Podemos concentrar-nos
especialmente na história dos avivamentos e dos grandes despertamentos
espirituais; e também podemos ler biografias dos homens que no passado
foram grandemente honrados por Deus em sua apresentação do evangelho.
Mas devemos notar aqui um princípio da maior importância. Quando digo
que é bom fazer um retrospecto e ler a história do passado e as
biografias de grandes homens que Deus usou no passado, espero que esteja
claro em nossas mentes que precisamos retornar para além dos últimos
100 anos. Vejo muitos bons evangélicos que parecem ser de opinião que
não houve nenhum real labor evangelístico até por volta de 1870. Há os
que parecem pensar que não se conheceu obra evangelística antes do
surgimento de Moody. Conquanto demos graças a Deus pela gloriosa obra
realizada nos últimos 100 anos, eu os conclamo a fazerem um estudo
completo da história pretérita da Igreja. Vão até o século dezoito. Vão
até o tempo dos puritanos, e para mais atrás ainda, à Reforma
Protestante. Retrocedam mais ainda, e estudem a história daqueles grupos
de evangélicos que viveram no continente europeu na época em que o
catolicismo romano detinha o poder supremo. Vão direto aos Pais
Primitivos que defendiam idéias evangélicas. É uma história que pode ser
rastreada ininterruptamente até a própria Igreja Primitiva. Esse estudo
é de importância vital, para que não venhamos a supor, em função de uma
falsa visão da história, que a obra evangelística só pode ser feita de
uma certa maneira e com a aplicação e o uso de certos métodos.
Eu
gostaria de recomendar a vocês um bem completo estudo daquele teólogo
americano, Jonathan Edwards. Foi uma grande revelação para mim,
descobrir que um homem que pregava como ele podia ser honrado por Deus
como o foi, e Ter tão grandes resultados para o seu ministério como
teve. Ele era um grande erudito e filósofo, que redigia cada palavra dos
seus sermões. Tinha vista fraca, e costumava ficar no púlpito com o seu
manuscrito numa das mãos e uma vela na outra e, conforme lia o seu
sermão, homens não somente foram convertidos, mas alguns deles
literalmente caíam no chão sob a convicção de pecado sob o poder do
Espírito. Quando pensamos na obra evangelística em termos de
evangelização popular dos 100 anos recém-passados, acho que poderíamos
ser tentados a dizer que um homem que pregasse daquela maneira não teria
a menor possibilidade de obter conversões . todavia, ele foi um homem
usado por Deus no Grande Despertamento ocorrido no século 18. Assim, eu
os concito a se entregarem completamente ao estudo da história da Igreja
e das coisas grandiosas que Deus fez em várias eras e períodos. Aí
estão, pois, as duas linhas mestras que seguiremos na abordagem deste
assunto – o estudo da Bíblia e um estudo da Igreja Cristã.
Os Princípios Fundamentais
- O objetivo supremo desta obra é glorificar a Deus
.
Esse é o ponto central. Esse ;é o objetivo que deve dominar e
sobrepujar todos os demais. O primeiro objetivo da pregação do evangelho
não é salvar almas; É GLORIFICAR A DEUS. Não se tolerará que nenhuma
outra coisa, por melhor que seja nem por mais nobre, usurpe esse
primeiro lugar.
- O único poder que realmente pode realizar esta obra é o Espírito Santo
.
Quaisquer que sejam os dons naturais que um homem possua , o que quer
que um homem seja capaz de fazer como resultado das suas propensões
naturais, o trabalho de apresentar o evangelho e de levar àquele supremo
objetivo de glorificar a Deus na salvação dos homem, é um trabalho que
só pode ser feito pelo Espírito Santo. Vocês vêem isso no próprio Novo
Testamento. Sem o Espírito, é-nos dito, não podemos fazer nada. (Desde
os tempos bíblicos até a história da igreja nos mostra que somente
através da obra do Espírito Santo é que o evangelho foi pregado com
poder e autoridade).
- O único e exclusivo meio pela qual o Espírito Santo opera é a Palavra de Deus
.
Isso é algo que se pode provar facilmente. Vejam o sermão que foi
pregado por Pedro no dia de Pentecoste. O que ele fez realmente foi
expor as Escrituras. Ele não se levantou para relatar as suas
experiências pessoais. Ele deu a conhecer as Escrituras; esse foi sempre
o seu método. E esse é também o método característico de Paulo, como se
vê em Atos 17:2: “disputou com eles sobre as Escrituras”. No trato com o
carcereiro de Filipos, vocês vêem que ele pregou-lhe Jesus Cristo e a
Palavra do Senhor. Vocês recordarão as suas palavras na Primeira
Epístola a Timóteo, onde ele diz que a vontade de Deus ;e que todos os
homem sejam salvos e sejam levados ao conhecimento da verdade (1
Tm.2:4). O meio usado pelo Espírito Santo é a verdade.
- A verdadeira motivação para a evangelização deve provir da apreensão destes princípios
. E, portanto, de um zelo pela honra e glória de Deus e de um amor pelas almas dos homens.
- Há um constante perigo de erro e de =heresia, mesmo entre os mais sinceros, e também o perigo de um falso zelo e do emprego de métodos antibíblicos
.
Não há nada sobre o que somos exortados mais vezes no Novo Testamento
do que sobre a necessidade de constante auto-exame e de retorno às
Escrituras.
Aí,
penso eu, vocês têm cinco princípios fundamentais claramente ensinados
na Palavra de Deus e confirmados profusamente na subsequente história da
Igreja Cristã.
A Aplicação dos Princípios
Isto
me leva à Segunda divisão principal do nosso assunto, que é a aplicação
desses princípios à obra concreta da apresentação do evangelho. Este é
um assunto que se divide naturalmente em duas partes principais. Há
primeiro a obra de evangelização, e depois a obra de edificação e
instrução na justiça.
A Evangelização e os Seus Perigos
- O primeiro é o de exaltar a decisão como tal, e este é um perigo especialmente quando vocês estão trabalhando com jovens (…). Mostra-se às vezes no uso da música. (…) Fiam-se na música e no cântico de coros para produzirem o efeito desejado e de ocasionarem decisão. (…) Há os que tem o Dom de contar histórias de maneira comovente e eficaz. Outros parecem por a sua confiança no encanto pessoal do orador.(…)
- O segundo perigo é que as pessoas podem chegar a uma decisão resultante de um falso motivo. Às vezes as pessoas se decidem por Cristo simplesmente porque estão desejosas de ter a experiência que outros tiveram (…) Ou pode ser o desejo de Ter este maravilhoso tipo de vida do qual lhe falaram. O evangelho de Jesus Cristo dá-nos uma vida da maravilhosa, e louvamos a Deus por isso, mas a verdadeira razão para nos tornarmos cristãos não é que tenhamos uma vida maravilhosa; é, antes, que estejamos em correta relação com Deus. Às vezes Cristo é apresentado como herói. (…) poderá ser que (…) se unam a nossa classe bíblica ou à nossa Igreja simplesmente porque a mensagem atraiu o seu instinto heróico. (…)
- E, a seguir, o último perigo que desejo acentuar sob o presente título, é a terrível falácia de apresentar o evangelho em termos de “Cristo precisa de você”, e de dar a impressão de que, se o rapaz não se decide por Cristo, é um mal sujeito. (…)
Devemos
apresentar a verdade; esta terá que ser uma exposição positiva do
ensino da Palavra de Deus. Primeiro e acima de tudo, devemos mostrar aos
homens a condição em que se acham por natureza, à vista de Deus.
Devemos levá-los a ver que, independentemente do que façamos e do que
tenhamos feito, todos nós nascemos com “filhos da ira”; nascemos num
estado de condenação, culpados aos olhos de Deus; fomos concebidos em
pecado e fomos formados em iniquidade. Isso vem em primeiro lugar.
Feito
isso, devemos prosseguir e demonstrar a enormidade do pecado. Não
significa apenas que devemos mostrar a iniquidade de certos pecados. Não
há nada que seja tão vital como a distinção entre pecado e pecados. (…)
Depois devemos conclamar os nossos ouvintes a confessarem e a
reconhecerem os seus pecados diante de Deus e dos homens. E então
devemos ir adiante e apresentar a gloriosa e estupenda oferta de
salvação gratuita , que se acha unicamente em Jesus Cristo, e Este
crucificado. A única decisão, que é do mais diminuto valor, é a que se
baseia na compreensão dessa verdade. Podemos fazer os homens se
decidirem como resultado dos nossos cânticos, como resultado do encanto
da nossa personalidade, mas o nosso dever não conseguir seguidores
pessoais. O nosso dever não é simplesmente aumentar o tamanho das nossas
classes de estudo da Bíblia ou das organizações e igrejas. O nosso
dever é reconciliar almas com Deus. Repito que não há nenhum valor numa
decisão que não esteja baseada na aceitação da verdade.
A Edificação
A
minha Segunda subdivisão relacionada com a apresentação do evangelho é a
obra de edificação. Este é um grande tema, e tudo o que eu posso fazer é
simplesmente lançar certos princípios. Em nenhuma oura parte o perigo
de um falso método é mais real do que esta particular questão de
edificação, como o que me refiro ao ensino concernente à santificação e à
santidade. Não se pode ler o Novo Testamento sem perceber logo Que a
Igreja Primitiva reagia contra problemas, perigos e heresias incipientes
que a assediavam. Havia os que diziam, por exemplo: “Continuemos no
pecado para que a graça seja mais abundante”. Havia os que diziam que,
contanto que você fosse cristão, não importava o que você tinha feito,
que, contanto que você estivesse certo em suas crenças, o seu corpo não
importava e você podia pecar o quanto quisesse. Isto é conhecido como
antinomianismo. Havia os que se diziam sem pecados. Havia os que partiam
em busca de “conhecimento”, que alegavam Ter alguma experiência
esotérica especial que os outros , cristãos inferiores, ignoravam. (…)
Se
posso fazer um sumário de todos esses perigos, é o perigo de isolar um
texto ou uma idéia e construir um sistema em torno dele, em vez de
comparar Escritura com Escritura. Isso é procurar atalho no mundo
espiritual. As pessoas tentam chegar à santificação com um só movimento,
e assim se privam do processo descrito no Novo Testamento. A maneira de
evitar esse perigo é estudar o Novo Testamento, especialmente as
Epístolas. Devemos ter o cuidado de não tomar um incidente dos
Evangelhos e tecer uma teoria em torno dele(…) Devemos compreender que o
nosso padrão nesta questão particular(santidade/santificação) acha-se
nas Epístolas.(…)
Conclusão
Permitam-me
resumir tudo o que eu venho tentando dizer, da maneira seguinte: se
vocês quiserem ser competentes ministros do evangelho, se quiserem
apresentar a verdade de modo certo e verdadeiro, terão que ser
estudantes assíduos da Palavra de Deus, terão de lê-la sem cessar. Terão
que ler todos os bons livros que os ajudem a entendê-la e os melhores
comentários da Bíblia que puderem encontrar. Terão que ler o que
denomino teologia bíblica, a explicação das grandes doutrinas do Novo
Testamento, para que venham a entendê-las cada vez mais claramente e,
daí, sejam capazes de apresentá-las com clareza cada vez maior aos que
venham ouvi-los. A obra do ministério não consiste meramente em oferecer
a nossa experiência pessoal, ou em falar das nossa vidas ou das vidas
de outros, mas sim, em apresentar a verdade de Deus de maneira tão
simples e clara quanto possível. E o jeito de fazer isso é estudar a
Palavra e toda e qualquer coisa que nos ajude nessa tarefa suprema.
Talvez
vocês me perguntem: quem é suficiente para estas coisas? Temos outras
coisas que fazer; somos homens ocupados. Como poderemos fazer o que você
nos pede que façamos? Minha resposta é que nenhum de nós é suficiente
para estas coisas, todavia Deus pode capacitar-nos para fazê-las, se de
fato estamos desejosos de servi-lO. Não me impressionam muito esses
grandes argumentos de que vocês são homens ocupados, de que vocês têm
que fazer muitas coisas no mundo e, por isso, não têm tempo de ler estes
livros sobre a Bíblia e de estudar teologia, e por esta boa razão:
alguns dos melhores teólogos que conheci, alguns dos mais santos, alguns
dos homens mais culto, tiveram que trabalhar mais duro que qualquer de
vocês e, ao mesmo tempo, foram-lhes negadas as vantagens que vocês
gozam. “Querer é poder”. Se eu e vocês estivermos preocupados com as
almas perdidas, jamais deveremos alegar que não temos tempo para
preparar-nos para este grande ministério; temos que fabricar tempo.
Temos que aparelhar-nos para a tarefa, consciente da séria e Terrível
responsabilidade da obra. Temos que estudar, trabalhar, suar e orar para
podermos conhecer a verdade cada vez mais e cada vez mais
perfeitamente. Temos que pôr em prática em nossas vidas as palavras que
se acham em 1 Tm.4:12-16. Conceda-nos Deus a graça e o poder para
fazê-lo, para a honra e a glória do Seu santo nome.
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