Manhã, 14 de Dezembro de 1856
New Park Street Pulpit
AT THE MUSIC HALL, ROYAL SURREY GARDENS.
Sem fé é impossível agradar a Deus (Hb 11.6)
O antigo Catecismo da Assembléia pergunta: "Qual é o principal objetivo do ser humano?" e a resposta é: "Glorificar a Deus e alegrar-se nele para sempre." A resposta está totalmente correta, mas seria igualmente verdadeira se fosse mais curta. O principal objetivo do ser humano é "agradar a Deus";
não é necessário dizer que assim ele mesmo fica feliz, porque isso é um
fato inquestionável. Nós cremos que o sentido da vida humana, nesta
vida e na próxima, é agradar a Deus, seu Criador. Quem vive de um modo
que agrada a Deus, está fazendo aquilo que contribui mais para seu
bem-estar temporal e eterno. Ninguém pode agradar a Deus sem angariar
uma profunda felicidade, porque se alguém agrada a Deus é porque Deus o
aceita como filho, lhe dá a bênção da adoção, derrama sobre ele
generosamente da sua graça, torna-o uma pessoa abençoada nesta vida e
lhe garante uma coroa de vida eterna, que usará e que terá um brilho que
nunca diminui, mesmo depois que as coroas de glória terrena tiverem
todas sido consumidas. Por outro lado, se alguém não vive de modo a
agradar a Deus. é inevitável que ele traga tristeza e sofrimento para
esta vida. Ele está colocando vermes e podridão no meio das suas
alegrias, enchendo de espinhos o travesseiro sobre o qual se deitará na
morte, e abastecendo o fogo eterno com vermes de fogo que o consumirão
para sempre. Aquele que agrada a Deus está, pela graça divina, viajando
em direção à recompensa final de todos os que amam e temem a Deus; o que
não agrada a Deus, declara a Escritura, precisa ser banido da presença
de Deus e, em conseqüência, de gozar a felicidade. Se, portanto, estamos
certos ao dizer que agradar a Deus equivale a ser feliz, a única
pergunta importante é: como posso agradar a Deus? Na afirmação do nosso texto há algo muito solene: "Sem fé é impossível agradar a Deus." Isso é como dizer: "Faça
o que você puder, esforce-se o mais que puder, viva da melhor maneira
que você conseguir, faça os sacrifícios que quiser, seja o mais
destacado que conseguir em todas as coisas agradáveis e de boa fama", só que nenhuma dessas coisas pode agradar a Deus se não estiver misturada com fé. O Senhor disse aos judeus: "Toda oferta dos teus manjares temperarás com sal."(Lv 2.13). A nós ele diz: "Com tudo o que você faz você precisa trazer fé, pois 'sem fé é impossível agradar a Deus'."
Essa
é uma lei antiga; ela é tão antiga como o primeiro ser humano. Assim
que Caim e Abel nasceram neste mundo e atingiram a maturidade, Deus
proclamou de modo solene sua lei de que "sem fé é impossível agradá-lo".
Caim e Abel, num belo dia, construíram cada um um altar, um ao lado do
outro. Caim colheu frutos das árvores e do solo abundante e os colocou
sobre o seu altar; Abel trouxe das primeiras crias do rebanho e os
colocou sobre o altar dele. Estava para ser decidido qual Deus iria
aceitar. Caim tinha trazido do seu melhor, mas o trouxe sem fé;
Abel trouxe seu sacrifício, mas o trouxe com fé em Deus. Quem seria
aceito? Os sacrifícios tinham valor igual; os dois homens também tinham
valor igual. Sobre qual sacrifício descerá o fogo celestial? Qual o
Senhor Deus consumirá com o fogo do seu prazer?
Oh! Vejo o sacrifício de Abel ardendo, e o semblante de Caim se
fechando, pois Deus se agradou de Abel e de sua oferta, mas não se
agradou de Caim e de sua oferta. A mesma coisa acontecerá até que último
ser humano foi levado para o céu. Jamais haverá uma oferta aceitável
que não foi temperada com sal. Por melhor que seja, na aparência tão boa
como a que foi feita com fé, mas Deus não pode e não vai aceitá-la se
não vier com fé, porque é ele que declara: "Sem fé é impossível agradar a
Deus."
Irei esforçar-me esta manhã para condensar meus pensamentos o mais que eu puder, trazendo uma exposição do que é fé; em segundo lugar explanarei que sem fé é impossível ser salvo; em terceiro lugar, farei uma pergunta: "Você tem essa fé que agrada a Deus?"
I. Primeiro, a exposição. O que é fé?
Os
escritores antigos, que são de longe os mais sensíveis — você percebe
que os livros escritos há duzentos anos pelos antigos puritanos têm mais
sentido em uma linha que em uma página dos nossos livros novos, e mais
em uma página do que em um livro inteiro da teologia moderna — o
escritores antigos lhe dizem que a fé se compõe de três coisas:
conhecimento, concordância e o que eles chamam de confiança, ou seja,
tomar posse do conhecimento com o qual concordamos e assimilá-lo
confiando nele.
1.
Comecemos com o início. O primeiro elemento da fé é conhecimento.
Ninguém pode crer em algo que ele não sabe. Isso é uma afirmação clara,
evidente em si mesma. Se ouço falar de uma coisa que não conheço, não
posso crer nela. Mesmo assim há pessoas que têm fé como o pedreiro que,
quando lhe perguntaram no que ele cria, respondeu. "Creio no que a igreja crê." "E no que a igreja crê?" "A igreja crê no que eu creio." "Sim, mas no que você e a igreja crêem?"
"Bem, cremos na mesma coisa." A única coisa em que esse homem cria era
que a igreja estava certa, mas no que ele não sabia dizer. É inútil que
alguém diga: "Eu sou crente",
se não sabe no que crê; mesmo assim tenho visto pessoas com esta
posição. Ouviram uma pregação empolgante que agitou o sangue deles; o
pregador gritava: "Creia! Creia! Creia!" e de repente as pessoas põe nas suas cabeças de que são crentes, e saem por aí dizendo isso. Quando lhes perguntam-. "Bem, no que vocês crêem?",
não sabem dar a razão da esperança que há neles. Crêem que irão ao
culto no próximo domingo; pretendem juntar-se a certo tipo de pessoas;
decidem cantar com muita força, e serem maravilhosos a seus próprios
olhos, por isso acham que serão salvos; mas não sabem dizer no que
crêem. Bem, para mim a fé não é verdadeira se a pessoa não sabe no que
crê.
O apóstolo disse: "Como
crerão naquele de quem nada ouviram? E como ouvirão, se não há quem
pregue? E como pregarão, se não forem enviados?"(Rm 10.14,15).
Para ter fé verdadeira, por- tanto, a pessoa precisa ter algum
conhecimento da Bíblia. Você pode ter certeza de que vivemos em uma
época em que não se ensina tanto a Bíblia como antes. Há uns cem anos o
mundo estava cheio de intolerância, crueldade e superstição. Nós sempre
vamos para os extremos, e agora estamos no outro. Naquela época se
dizia: "Só há uma fé certa! Acabem com todas as outras, pela tortura e pela espada!" Agora dizem: "Por mais contraditórios que nossos credos sejam, estão todos certos." E só usar o bom senso para ver que isso não é verdade. Alguns dizem: "Essa ou aquela doutrina não precisa ser pregada, nem se precisa crer nela."
Bem, se não é preciso pregá-la, ela não precisava ser revelada. Você
está questionando a sabedoria de Deus quando diz que uma doutrina é
desnecessária, pois está dizendo que Deus revelou algo que não é
necessário, e lhe faltaria sabedoria tanto se fizesse mais do que o
necessário como se fizesse menos. Eu tenho certeza de que as pessoas
deveriam estudar todas as doutrinas da Palavra de Deus, e que sua fé
deveria apossar-se de tudo do que tratam as Escrituras Sagradas,
especialmente no que concerne a pessoa do nosso bendito Redentor.
Precisa haver certo grau de conhecimento antes que possa haver fé.
"Examinai as Escrituras, porque julgais ter nela a vida eterna, e são elas mesmas que testificam" de Cristo. (Jo 5. 39). Com a pesquisa e o estudo vem o conhecimento, com o conhecimento vem a fé, e com a fé vem a salvação.
2.
As pessoas, porém, podem ter conhecimento e não ter fé. Posso saber
algo e mesmo assim não acreditar. Por isso a concordância precisa
acompanhar a fé: isto é, também precisamos concordar que aquilo que
sabemos é com toda certeza a verdade de Deus. Bem, para ter fé é
necessário não só que eu leia e compreenda as Escrituras, mas que eu as
receba em minha alma como sendo a verdade do Deus vivo, que eu aceite
com devoção, de todo o meu coração, toda a Escritura como inspirada pelo
Altíssimo, e toda a doutrina que exige que eu creia para ser salvo.
Você não pode ter a Escritura e crer no que quiser; você não pode crer
nas Escrituras com meio empenho, pois se o fizer intencionalmente, você
não tem a fé que olha só para Cristo. A fé verdadeira aceita totalmente
as Escrituras; toma uma página e diz: "Não importa o que está nesta página, eu creio nisso"; passa para o próximo capítulo e diz: "Aqui
há algumas coisas difíceis de entender, que os incultos e instáveis
distorcem, como também fazem com outros trechos das Escrituras, para sua
própria destruição; porém, por mais duro que seja, eu creio." Vê a
Trindade; não consegue compreender a Trindade na Unidade, mas crê nela.
Vê o sacrifício expiatório; há algo difícil neste conceito, mas ela crê
nele. Seja o que for que vê na revelação, ela coloca seus lábios com
devoção sobre o livro e diz: "Amo
tudo isso, concordo de modo pleno e total, de todo o coração, com cada
palavra, seja advertência, promessa, provérbio, preceito ou bênção.
Creio que, como está tudo na Palavra de Deus, é tudo totalmente
verdadeiro." Todo o que for salvo precisa conhecer as Escrituras e concordar plenamente com elas.
3.
Entretanto, é possível que alguém tenha tudo isso sem que tenha fé
autêntica, porque a parte principal da fé está na terceira palavra, ou
seja, na confiança na verdade. Não simplesmente acreditar nela, mas
tomar posse dela e apoiar-se nela para salvação. Descansar na verdade é a
palavra que os pregadores antigos usavam. Você entende essa palavra:
reclinar-se sobre — dizer: "Isto é verdade. Confio minha salvação nela." A
fé verdadeira em sua essência reside nisso — descansar em Cristo. Saber
que Cristo é o Salvador não me salva; confiar nele como meu Salvador é
que vai me salvar. Não serei poupado na ira vindoura por crer que sua
expiação é suficiente; mas serei salvo tornando essa expiação a minha
garantia, meu refúgio, meu tudo. O cerne, a essência da fé está nisso —
fundamentar-se sobre a promessa. Não é a bóia salva-vidas que há no
navio que salva alguém que está-se afogando, nem a convicção de que ela é
uma invenção muito boa e prática. Não! E preciso colocá-la em volta da
cintura, ou segurá-la com as mãos, ou afogaremos. Usando uma ilustração
antiga e bem conhecida: imagine que começou um incêndio num quarto do
segundo andar de uma casa, e as pessoas se aglomeram na rua. Há uma
criança neste andar: como escapará? Ela não pode pular, porque se faria
em pedaços. Um homem forte vem para a frente da casa e grita: "Jogue-se nos meus braços."
Faz parte da fé saber que o homem está ali; outra parte da fé é crer
que o homem é forte; mas a essência da fé reside em deixar-se cair nos
braços do homem. Essa é a prova da fé e sua verdadeira essência e
medula. Portanto, pecador, você precisa saber que Cristo morreu pelos
pecados; precisa compreender também, e crer, Então, pecador, você
precisa saber que Cristo morreu pelo pecado. Crer que Cristo é capaz de
te salvar, mas você não será salvo exceto se colocar sua confiança nEle
para ser seu Salvador para sempre.
Como Hart diz em seu hino, que expressa a verdade do Evangelho:
Confie nEle, Confie totalmente
Não confie em nada mais
Nada a não ser Cristo
Pode transformar os pecadores
Esta
é a fé que salva. E no entanto, tens vivido de forma profana até este
momento; esta fé, se for dada a você, neste instante teus pecados serão
apagados, sua natureza será transformada e você se tornará um novo homem
em Jesus Cristo. Ele vai levar você a viver uma vida santa e dar uma
eterna salvação tão segura como se um anjo levasse você imediatamente
com suas asas brilhantes até o céu. Essa é uma questão muito importante.
Por enquanto, pela fé homens tem sido salvos, sem ela estão condenados. Como disse Brooks em uma de suas obras admiráveis:
‘Aquele que crê no Senhor Jesus Cristo será Salvo, mesmo que seus pecados sejam muitos. Mas aquele que não crê no Senhor Jesus deve
ser condenado, mesmo que seus pecados sejam “poucos”. “Tu tens fé?” As
Escrituras declaram: “Sem fé é impossível agradar a Deus”.
II. Passamos agora para a explanação — por que não podemos ser salvos sem fé.
Há algumas pessoas presentes aqui que estão dizendo: "Agora vamos ver se o Sr. Spurgeon segue alguma lógica."
Vou decepcioná-los, senhores, porque não penso em segui-la. Eu creio
ter a lógica que apela aos corações das pessoas, mas não estou propenso a
usar a lógica da cabeça, mais fraca, quando posso conquistar os
corações de outra maneira. Se, porém, for necessário, não terei medo de
provar que conheço mais lógica, também sobre muitas outras coisas, do
que os pequenos que arriscam criticar-me. Seria bom para eles se
soubessem como controlar a língua, o que pelo menos já seria uma parte
importante da retórica. Eu confio que minha explanação apelará ao
coração e à consciência, apesar de não exatamente agradar os que gostam
tanto de exibições de lógica — Para quem importa discutir Que sexo os
anjos podem ter.
1. "Sem fé é impossível agradar a Deus."
Eu concluo isso do fato de que não há um só caso de pessoa na Bíblia
que agradou a Deus sem ter fé. O capítulo onze de Hebreus traz a lista
dos que agradaram a Deus. Ouça seus nomes-. "Pela
fé, Abel ofereceu a Deus mais excelente sacrifício"; "Pela fé, Enoque
foi trasladado"; "Pela fé, Noé [...] aparelhou uma arca"; "Pela fé,
Abraão, quando chamado, obedeceu, a fim de ir para um lugar que devia
receber por herança"; "Pela fé, peregrinou na terra da promessa"; "Pela
fé, também, a própria Sara rece¬beu poder para ser mãe"; "Pela fé,
Abraão [...] ofereceu Isaque"; "Pela fé, igualmente Isaque abençoou a
Jacó"; "Pela fé, Jacó [...] abençoou cada um dos filhos de José"; "Pela
fé, José, próximo do seu fim, fez menção do êxodo dos filhos de Israel";
"Pela fé [Moisésl abandonou [as riquezas d] o Egito"; "Pela fé,
atravessaram o mar Vermelho como por terra seca"; "Pela fé, miram as
muralhas de Jerico"; "Pela fé, Raabe, a meretriz, não foi destruída"; "E
que mais direi? Certamente, me faltará o tempo necessário para referir o
que há a respeito de Gideão, de Baraque, de Sansão, de Jefté, de Davi,
de Samuel e dos profetas." Todos estes foram pessoas de fé. Outros
mencionados na Bíblia fizeram alguma coisa, mas Deus não os aceitou.
Homens se humilharam, mas Deus não os salvou. Acabe teve um momento de
contrição, mas seus pecados nunca foram perdoados. Pessoas se
arrependeram, mas não foram salvas, porque seu arrependimento era falso.
Judas se arrependeu, enforcou-se e não foi salvo. Outros confessaram
seus pecados, mas não foram salvos, como Saul. Ele disse a Davi: "Pequei; volta, meu filho"(1Sm 26.21),
mas mesmo assim não mudou sua atitude. Multidões têm confessado o nome
de Cristo e feito coisas maravilhosas, sem jamais agradarem a Deus pela
razão simples de que não tiveram fé. Se não houve ninguém mencionado na
Escritura, que registra a história de alguns milhares de anos, não é
provável que houve alguém nos outros dois mil anos da história do mundo,
se não houve nos quatro mil anteriores.
2. A parte seguinte da explanação é: fé é a graça de humilhar-se,
e nada é capaz de fazer um homem humilhar-se senão a fé. Ocorre que, se
alguém não se humilhar, seu sacrifício não pode ser aceito. Os anjos
sabem disso: quando eles louvam a Deus, eles cobrem seus rostos com suas
asas. Os salvos sabem disso: quando louvam a Deus, eles lançam suas
coroas diante dos pés dele. Alguém que não tem fé prova que não consegue
humilhar-se: ele não tem fé exatamente porque é orgulhoso demais para
crer. Ele declara que não vai renunciar ao seu intelecto, que não se
tornará como uma criança e crer bonitinho o que Deus manda. Ele é
arrogante demais, e não pode entrar no céu porque a porta do céu é tão
baixa que ninguém consegue passar por ela a não ser que se curve. Não
houve nenhuma pessoa que pôde entrar na salvação de cabeça erguida.
Temos de ir a Cristo com os joelhos dobrados, pois, apesar de ele ser
uma porta grande o suficiente para o maior pecador poder passar, essa
porta é tão baixa que as pessoas precisam inclinar o rosto até o chão se
quiserem ser salvas. Portanto, é dessa fé que precisamos, porque a
falta de fé é evidência clara da ausência de humildade.
Vejamos outras razões. A fé é necessária à salvação porque a Escritura nos diz que as obras não podem salvar.
Contarei uma história bem conhecida, para que nem os mais simples
deixem de entender o que quero dizer. Certo dia um pastor estava a
caminho do lugar onde ia pregar. Seu caminho levou-o pelo alto de um
monte, e abaixo dele via-se as aldeias adormecidas em sua beleza, os
campos de trigo imóveis na primeira luz do sol. Ele, porém, não prestou
atenção nisso porque viu uma mulher saindo da porta da sua casa que, ao
vê-lo, veio em sua direção com a maior ansiedade e disse:
— Meu senhor, tem algumas chaves aí? Eu quebrei a chave do meu armário, e preciso tirar algumas coisas.
Ele respondeu:
— Eu não trouxe nenhuma chave. — Ela ficou decepcionada, porque esperava que alguém tivesse alguma chave.
Mas
ele continuou: — Imaginemos que eu tivesse alguma; é bem possível que
ela não encaixasse na fechadura, e a senhora ficaria sem poder tirar as
coisas que deseja. Mas não desanime; espere por alguém outro.
Entretanto, no desejo de aproveitar a situação, ele per-guntou:
— A senhora já ouviu falar da chave do céu?
— Oh,
sim — ela disse, — já vivi bastante tempo e fui à igreja o suficiente
para saber que, se trabalhamos bastante e conseguimos o pão com o suor
do rosto, tratarmos bem nossos próximos e nos comportamos, como diz o
Catecismo, de modo humilde e reverente diante de todos os que são
melhores do que nós, e se fazemos nossa obrigação na estação da vida em
que Deus se agradou de nos colocar, e fazemos nossas orações
regularmente, seremos salvos.
— Ah
— ele retrucou, — minha senhora, essa é uma chave quebrada, porque a
senhora quebrou os mandamentos; a senhora não fez todas as suas
obrigações. A chave é boa, mas a senhora a quebrou.
— Por favor, senhor — disse ela, vendo que ele enten¬dia do assunto e com um olhar assustado, — o que foi que eu esqueci?
— Bem
— respondeu ele, — a senhora esqueceu a coisa mais importante, o sangue
de Jesus Cristo. A senhora não ouviu falar que a chave do céu está
presa ao seu cinto? Quando ele abre, ninguém pode fechar; quando ele
fecha, nin¬guém pode abrir. — Explicando melhor para ela, ele continuou:
— E Cristo e só ele quem pode abrir o céu para a senhora, e não as suas
boas obras.
— Mas, senhor pastor — exclamou ela, — quer dizer que nossas boas ações são desnecessárias?
— De
forma alguma, quando juntas com a fé. Se a senhora crê primeiro, pode
fazer tantas boas ações quantas quiser. No entanto, se a senhora crê,
nunca mais vai confiar nelas, porque se o fizer, a senhoras arruinou-as,
e não são mais boas ações. Faça quantas boas obras quiser, mas coloque
sua confiança total¬mente no Senhor Jesus Cristo; se não o fizer, sua
chave jamais abrirá a porta do céu.
Portanto,
meus ouvintes, precisamos ter fé autêntica porque a velha chave das
obras foi tão quebrada por nós que jamais entraremos no paraíso com ela.
Se alguém aqui acha que não tem pecados, vou ser direto: você está se
iludindo, e não há verdade em você. Se você imagina que por suas boas
obras entrará no céu, jamais houve ilusão mais fatal. No último grande
dia você descobrirá que suas esperanças eram inúteis, e que, como folhas
secas das árvores no outono, suas ações mais nobres serão levadas pelo
vento para o fogo onde você mesmo sofrerá para todo o sempre. Preste
atenção em suas boas obras; faça-as depois de crer, mas lembre-se, o
meio de ser salvo é simplesmente crer em Jesus Cristo.
4. Mais uma vez: sem fé é impossível ser salvo e agradar a Deus, porque sem fé não há união com Cristo.
Ocorre que a união com Cristo é indispensável à nossa salvação. Se me
achego ao trono de Deus com minhas orações, não recebe¬rei respostas
para elas se eu não trouxer Cristo comigo. Os antigos molóssios,
quando não conseguiam do rei o que precisavam, adotavam um expediente
singular: tomavam o único filho do rei nos braços e exclamavam, caindo
de joelhos diante dele: "O rei, por amor ao teu filho atenda o nosso pedido." Ele sorria e dizia: "Não nego nada a quem pede em nome do meu filho."
Com
Deus é assim. Ele não nega nada a quem vem com Cristo pela mão; quem
vem sozinho precisa ser expulso. A união com Cristo é, afinal de contas,
o ponto central da salvação. Deixe-me contar uma história para ilustrar
isso: as quedas impressionantes do Niágara são conhecidas em todo o
mundo. Elas formam um espetáculo esplêndido e podem ser ouvidas de muito
longe, mas são fatais para quem por acidente for tragado por elas. Há
alguns anos dois homens, um barqueiro e um mineiro, estavam em um barco
que não conseguiam mais controlar. Estavam sendo levados rapidamente
pela correnteza, e era inevitável que caíssem na catarata e fossem
despedaçados. Na margem havia pessoas que os viam mas não podiam fazer
muito para salvá-los. Acabaram salvando um homem jogando-lhe uma corda
que ele conseguiu agarrar. No mesmo instante em que a corda chegou à sua
mão, um tronco passou boiando pelo outro homem. O barqueiro, confuso e
irrefletido, em vez de também segurar a corda agarrou o tronco. O erro
foi fatal. Ambos estavam em perigo de morte, mas um foi puxado para a
margem porque tinha um vínculo com as pessoas ali, enquanto o outro se
segurava no tronco e foi arrastado pela correnteza, e desapareceu. Você
não vê que aqui está uma ilustração prática? A fé é o vínculo com
Cristo. Cristo está por assim dizer na margem, segurando a corda da fé
e, se segurarmos a outra ponta com a mão da confiança, ele nos puxa para
si. Nossas obras, porém, quando não têm relação com Cristo, são
arrastadas pela correnteza do desespero. Podemos segurá-las com toda a
força, até com ganchos de aço, mas no fim elas não nos servem de nada.
Tenho certeza de que você entenda o que quero lhe mostrar. Algumas
pessoas não gostam de histórias; continuarei usando-as até que parem de
objetar. Não há maneira melhor de apresentar a verdade do que contando
histórias, como Jesus quando falou do homem que tinha dois filhos, e do
homem rico que foi viajar e deu certa quantia a cada funcionário: a um
dez talentos, a outro um. Fé, então, é uma união com Cristo. Verifique
se você a tem. Porque se não, apegado as suas obras você irá sendo
levado pelo fluxo! Se apegue as suas obras e serás arrastado para o
abismo. Perdido porque suas obras não vão levá-lo a Cristo e não está
conectada as bênçãos do Redentor. Mas você, pobre pecador, com todo seu
pecado sobre si, com a corda do juízo em seu pescoço, Cristo pode
salvá-lo, não temas –
Sua honra está comprometida para salvar
As suas pobres ovelhas
Todas que o Pai celestial lhe deu
Suas mãos são poderosas para salvá-las
5. Só mais um argumento. "Sem fé é impossível agradar a Deus" porque é impossível perseverar na santidade sem fé. Quantos cristãos de tempo bom existem em nossos dias! Muitos cristãos se parecem com náutilos,
que com. tempo bom e agradá¬vel nadam na superfície do mar em pequenos
cardumes muito bonitos como navios poderosos, mas assim que a primeira
lufada de vento agita a água, eles recolhem as velas e submergem nas
profundezas. Muitos cristãos são assim. Em boa companhia, em salas de
culto evangélicas, em grupos de estudo em casa, em capelas e reuniões do
conselho eles são tremendamente espirituais; porém quando são expostos a
um pouco de ridículo, se alguém sorri para eles e os chama de
metodistas ou presbiterianos ou algum nome depreciativo, acabou a
religiosidade deles até o próximo dia de tempo bom. Então, quando tudo
está bem e a religião atende a suas aspirações, lá vão eles levantar as
velas, e são espirituais como antes. Creia em mim, esse tipo de religião
é pior que nenhuma. Eu quero que as pessoas sejam exatamente o que são,
homens direitos. Se alguém não ama a Deus, que não diga o contrário;
mas se é um cristão de verdade, um seguidor de Jesus, que o diga e se
garanta. Não há por que envergonhar-se disso; a única razão de se
envergonhar é de ser hipócrita. Sejamos honestos naquilo que
professamos, e isso será nossa glória. 0 que você faria sem fé em épocas
de perseguição?! Vocês, pessoas boas e consagradas que não têm fé, o
que vocês fariam se a estaca fosse novamente erigida em Smithfield e novamente as chamas reduzissem os santos a cinzas? Se a torre dos lolardos
fosse novamente aberta, se a tortura fosse aplicada, o tronco usado,
como já foi, pela igreja protestante, como testemunha a perseguição do
meu predecessor, Benjamin Keach, que certa vez foi preso no tronco em Aylesbury por escrever um livro contra o batismo de crianças. (Na
época em que a Igreja Anglicana era a única autorizada na Inglaterra,
grupos independentes como os lolardos eram às vezes terrivelmente
perseguidos - N.T.).
Mesmo
se a forma mais branda de perseguição fosse reiniciada, como as pessoas
se espalhariam em todas as direções! Alguns dos pastores também
abandonariam seus rebanhos. Contarei mais uma história e espero com isso
levá-los a ver a necessidade da fé, enquanto me encaminho à última
parte do meu discurso. Um americano dono de escravos, na ocasião de
comprar mais um, disse ao mercador com quem estava barganhando:
— Diga-me honestamente: quais são seus defeitos? — O vendedor respondeu:
— Que eu saiba, ele tem só um defeito: ele costuma orar.
— Bem — disse o comprador, — eu não gosto disso, mas conheço algo que vai curá-lo rapidamente desse defeito.
Assim,
no dia seguinte o escravo foi surpreendido por seu patrão quando orava
com fervor em meio à plantação, intercedendo por este, a esposa dele e
sua família. O homem ficou parado ouvindo, e não disse nada no momento;
mas, na manhã seguinte, chamou-o e disse:
— Não quero brigar com você, meu homem, mas não quero que ore na minha propriedade; portanto, pare com isso.
— Patrão — respondeu este, — não consigo parar de orar; tenho que orar sempre.
— Vou ensinar você a orar se continuar com isso!
— Patrão, tenho de orar.
— Bem, vou lhe dar vinte e cinco chicotadas por dia até que você pare.
— Patrão, mesmo que me dê cinqüenta, tenho de orar.
— Se
é assim que você é rebelde com seu patrão, vai ter logo o que merece. —
O patrão amarrou-o no pelourinho, deu-lhe vinte e cinco chicotadas e
perguntou se iria orar de novo.
— Sim,
patrão, tenho de orar sempre; não consigo parar. O patrão olhou
atônito; não conseguia compreender como um pobre santo podia continuar
orando quando não parecia lhe fazer nenhum bem, só perseguição. Contou à
sua esposa do ocorrido. Sua esposa lhe disse:
— Por
que você não pode deixar o pobre homem orar? Ele faz bem o seu
trabalho; você e eu não ligamos para a oração, mas não há mal algum em
deixá-lo orar, se ele cumprir com suas tarefas.
— Mas eu não gosto disso — disse o patrão. — Ele sempre me deixa muito assustado. Você devia ver como ele olha para mim.
— Ele estava com raiva?
— Não.
Eu não devia me preocupar com isso, mas depois que eu o tinha surrado
ele olhou para mim com lágrimas nos olhos, como se tivesse mais pena de
mim do que de si mesmo.
Naquela
noite o patrão não conseguiu dormir. Ele rolava na cama de um lado para
outro; seus pecados lhe foram trazidos à memória, e ele se
conscientizou de que tinha perseguido um santo de Deus. Sentando-se na
cama, ele disse à sua esposa-.
— Mulher, você poderia orar por mim?
— Eu nunca orei em toda a minha vida — ela respondeu. — Não sei orar por você.
— Estou perdido — disse ele, — se alguém não orar por mim; não posso orar por mim mesmo. — Eu não sei de ninguém aqui na propriedade que saiba orar, a não ser Cuffey, o novo escravo — disse sua esposa. Fizeram soar a campainha, e Cuffey foi trazido. Tomando a mão de seu servo negro, o patrão disse:
— Cuffey, você pode orar por seu patrão?
— Patrão, estou orando pelo senhor desde que me chicoteou, e pretendo orar sempre pelo senhor. Cuffey
caiu de joelhos e derramou sua alma em lágrimas, e ambos, marido e
esposa, foram convertidos. Aquele homem negro não poderia ter feito isto
sem fé. Sem fé ele teria ido embora na mesma hora, dizendo:
— Patrão, vou parar de orar; não quero mais o chicote do homem branco.
Mas porque ele perseverou por sua fé, o Senhor hon¬rou-a e lhe deu a alma do seu patrão por salário.
III. Agora, para concluir, a pergunta, a pergunta vital: querido ouvinte, você tem fé?
Você crê no Senhor Jesus Cristo de todo o seu coração? Se sim, você tem
esperança de ser salvo. Sim, você pode concluir com certeza que jamais
verá a perdição. Você tem fé? Devo ajudar você a responder esta
pergunta? Quero lhe dar três testes, o mais breve que eu puder, para não
o cansar e depois chega por esta manhã. A pessoa que tem fé renunciou a
sua justiça própria. Se você colocar um átomo de confiança em si mesmo,
você não tem fé; se você se apoiar um pouco que seja em qualquer coisa
que não o que Cristo fez, você não tem fé. Se você confia em suas obras,
então elas são anticristo, e Cristo e anticristo de forma alguma podem
andar juntos. Cristo quer tudo ou nada; ele deve ser um Salvador
totalmente ou não ser Salvador. Se, então, você tem fé, você pode dizer:
Não tenho nada em minha mão;
Na cruz está a salvação.
Em
segundo lugar, a fé autêntica pode ser reconhecida porque gera uma
grande estima pela pessoa de Cristo. Você ama a Cristo? Você morreria
por ele? Você procura servi-lo? Você ama seu povo? Você pode dizer:
Jesus, teu nome é para mim
Som doce ao coração.
Sim!
Se você não ama a Cristo, você não crê nele, porque crer em Cristo gera
amor. E mais uma coisa: quem tem fé autêntica tem obediência autêntica.
Se alguém diz que tem fé e não tem obras, está mentindo. Apesar de não
confiarmos nas boas obras, sabemos que a fé sempre gera boas obras. A fé
é a mãe de toda a santidade, e não existe mãe que não ame seu filho. As
benção de Deus são dadas com ambas as mãos. Com uma mão Ele dá o perdão, com a outra dá santidade. E ninguém pode ter uma a menos que tenha a outra.
E
agora, caros ouvintes, devo me por de joelhos e suplicar a você por
amor a Cristo para responder a esta questão em sua silenciosa câmara – Tu tens fé? Oh, responda – Sim ou não? Não diga – “eu não sei”, ou “Eu não me importo”
- Ah, você vai se importar um dia, quando a terra estiver perecendo e o
mundo sendo jogado para lá e para cá. Você vai se importar quando Deus
te convocar para o Juízo e quando ele condenar os infiéis e os
incrédulos. Oh, seja sábio – que você se importe agora se sente alguma
necessidade de Cristo, te imploro, por amor a Cristo a procurar fé agora
naquele que é exaltado nas alturas para poder dar arrependimento e
remissão de pecados. Se Ele der arrependimento, dará remissão também.
Oh pecadores que conhecem seus pecados! “Crê no Senhor Jesus e serás Salvo”.
Se lance sobre o amor e o sangue de Cristo, sua vida e sua morte, sua
miséria e seus méritos. E se você fizer isso, jamais cairá – mas será
salvo agora e guardado no Grande dia, quando não estar salvo será
terrível.
“Arrependa-se, arrependa-se. Por que morreria, Ó casa de Israel?” Toque-o, toque nas orlas de suas vestes e você será curado. Que Ele lhes ajudem a procederem assim. Amém e Amém!
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